O fato de ainda estarmos falando de uma franquia como As Panteras em 2019 diz muito sobre a insistência de Hollywood em atualizar (leia-se: reciclar) obras que já tinham dado certo no passado e esperar que estas possam cair nas graças do público atual. Frequentemente apontado com um dos principais exemplos de jiggle television, o seriado produzido pela ABC entre 1976 e 1981 fez enorme sucesso na época e ficou marcado na memória popular ao longo das décadas seguintes. Em 2000 e 2003, a série voltou a ficar em evidência graças aos dois longas dirigidos por McG (que mais tarde faria O Exterminador do Futuro: A Salvação) e estrelados por Cameron Diaz, Drew Barrymore e Lucy Liu – que… bem, não eram grandes coisas.
Mas aí, mais de 15 anos se passaram e Hollywood decidiu que tinha chegado a hora de tirar mais uma versão da gaveta. Dirigido, escrito, co-produzido e co-protagonizado por Elizabeth Banks, o novo As Panteras já começa com uma sequência no Rio de Janeiro que traz as espiãs Sabina Wilson e Jane Kano no meio de uma missão importante, mas que elas executam com notável facilidade. Após aparecer um programa de energia que ameaça à segurança do mundo inteiro, a nova “Bosley” (chefe das heroínas) resolve enviar Sabina e Jane para neutralizá-lo e, ao mesmo tempo, capturar seu desenvolvedor – e, por algum motivo, a cientista Elena Houghlin tem porque tem que fazer parte da operação junto às outras duas espiãs, tornando-se a terceira integrante das Panteras.
Protagonizado por três mulheres que sempre tomam o controle da ação para si (o que é notável por si só), As Panteras demonstra conhecer bem o sexismo institucional da Sociedade como um todo – o que fica claro logo no primeiro ato, quando Elena Houghlin aparece tentando ser ouvida pelo chefe, mas sendo repetidamente subestimada por ele. Ainda assim, a narrativa construída por Elizabeth Banks se destaca ao trazer as heroínas frequentemente reduzindo os esforços de seus inimigos homens a meras bobagens insignificantes, desde a sequência de abertura (que mostra Sabina Wilson colocando facilmente um vilão em posição de desvantagem) até o fato de o “Bosley” interpretado por Patrick Stewart ceder seu lugar à vivida por Elizabeth Banks. Além disso, há pelo menos duas Panteras que se sobressaem: Kristen Stewart, que encarna Sabina com uma postura irreverente e afiada não só no sarcasmo de seus comentários, mas também no deboche de suas caras e bocas; e Naomi Scott, que retrata Elena como uma jovem inexperiente, mas cujo humor vem justamente de ser a novata do grupo.
Infelizmente, o resto do elenco pouco tem a fazer com seus personagens: Ella Balinska raramente consegue tornar Jane Kano uma heroína interessante ou memorável, ao passo que Elizabeth Banks fica presa a uma personagem que nada mais é do que… a nova chefona do grupo (e nada mais que isso) – o que só não representa uma decepção tão grande quanto o seu desempenho como diretora de ação: coordenando as sequências de tiroteios, perseguições e lutas físicas de maneira terrivelmente caótica, Banks parece seguir a cartilha Michael Bay ao estabelecer a mise-en-scène de sua obra, transformando as cenas de ação em uma combinação ininteligível de cortes rápidos, movimentos de câmera e planos ininteligíveis (em alguns momentos, é impossível entender quem está aonde em relação a quem ou a quê). Como se não bastasse, Banks oscila aleatoriamente entre ações extremamente intensas e diálogos puramente expositivos, o que prejudica bastante o ritmo da narrativa.
Não que o roteiro em si seja dos melhores, desenvolvendo uma história simples e batida de forma muito mais complicada do que precisava e se enrolando no meio de detalhes quase sempre desnecessários. Para piorar, todas as tentativas de surpreender o espectador soam tolas e baratas, já que não há uma única reviravolta que não tenha sido esperada desde o início (ou vocês realmente não esperavam que aquele personagem se tornaria vilão no terceiro ato?). Assim, à medida que a narrativa se aproxima do terceiro ato, ela também vai se esvaziando cada vez mais e mais e mais, perdendo gradualmente o impacto que deveria causar. Para completar, confesso que tive dificuldades em aceitar algumas atitudes… digamos, indiscretas demais para serem tomadas por três agentes secretas (como, por exemplo, trocar de roupa em uma cabine fotográfica que registraria toda a troca de disfarces).
Contando com um senso de humor tão irregular quanto todo o resto do filme (uma piadinha provoca um risinho aqui; outra falha miseravelmente ali), As Panteras é uma obra… medíocre, que não desperta impressões muito fortes. Não incomoda, mas também não apresenta nada que vá ser lembrado daqui a uma semana, podendo ser rapidamente esquecido assim que as luzes do cinema se acendem e os créditos começam a subir.