Os produtos da marca LEGO foram (e são) muito presentes para crianças de várias gerações – o que é louvável, já que estimulam a criatividade dos pequenos de maneira bastante saudável (algo que também se aplica ao jogo Minecraft). Jamais me esquecerei das casas, arranha-céus e artefatos fantásticos que criei através daqueles tijolinhos plásticos e multicoloridos, muito menos das aventuras loucas que elaborei em minha mente de oito anos de idade. E é por isso que Uma Aventura LEGO acaba se tornando uma experiência emocionalmente incrível, já que nos proporcionar uma espécie de reencontro com as crianças sonhadoras e inocentes que há muito passaram a habitar somente em nossas memórias.
Dirigido e escrito pelos mesmos Phil Lord e Christopher Miller de Tá Chovendo Hambúrguer e Anjos da Lei, o roteiro nos apresenta a Emmet, um operário extremamente comum e que, mesmo tentando arduamente, não sabe ao certo como interagir com as pessoas à sua volta. Contudo, quando se vê preso a um item capaz de impedir o maligno plano do Presidente Negócios de aterrorizar o universo com sua terrível arma de cola, o jovem resolve salvar o mundo se unindo à durona Megaestilo, ao mago Vitruvius, a um Batman bem diferente daquele que nos acostumamos a ver em outras obras e a várias personalidades fantásticas.
Dá para notar, portanto, que a trama parece ter sido pensada por uma criança, sem muita originalidade ou profundidade temática. Mas em vez de representar um defeito, o fato é que Uma Aventura LEGO funciona graças justamente a esta infantilidade, conversando diretamente com as crianças que ainda existem dentro de todos nós (com o perdão do clichê). Desta forma, torna-se difícil conter um imenso sorriso logo nos minutos iniciais da projeção, quando percebemos de imediato o tom adoravelmente “tolo” que permanecerá na próxima hora e meia – e acredite se possível: a reviravolta que ocorre no terceiro ato (e que justifica boa parte dos absurdos que vemos ao longo da narrativa) funciona não só por ser inesperada, mas também por revelar uma sensibilidade que complementa bem a comédia que vinha prevalecendo até então.
Apostando num senso de humor inesperadamente irônico, o filme se mostra bem mais irreverente, ácido e até mesmo anárquico do que poderíamos esperar, funcionando graças ao roteiro afiadíssimo, à criatividade da maioria das gags e à espontaneidade presente na composição vocal de todo o elenco. Desta forma, as tiradas vistas ao longo da projeção apresentam um conteúdo bem pensado e um timing que é bem-sucedido na maior parte do tempo – o que não quer dizer, claro, que todas as piadas atinjam o resultado ideal (e existem certas gracinhas que são repetidas insistentemente, a ponto de perderem um pouco da graça).
Mas para que as piadas funcionassem, era obrigatório que o roteiro demonstrasse alguma inteligência – e esta é mais uma missão que Uma Aventura LEGO cumpre com louvor: ao satirizarem as próprias condições daquele universo, Phil Lord e Christopher Miller revelam-se hábeis ao construírem aquela realidade através de elementos que sempre tendem à ironia. Com isso, o roteiro brinca constantemente com o fato de que todos aqueles seres são… bonequinhos, que vivem em um universo de brinquedo. Assim, é divertido ver a dificuldade que Emmet sente ao fazer polichinelo, os cabelos de Megaestilo se mexendo com rigidez, a cara do Guarda Bom sendo apagada para que reste apenas o Guarda Mau (e esta dualidade faz o personagem se tornar ainda mais interessante) e etc.
Com uma galeria de personagens fascinantes, a produção é hábil ao conceber figuras que desempenham funções claras na narrativa (percebam como é fácil se identificar com a inexperiência de Emmet, que serve como uma espécie de “guia turístico” que nos apresentará ao universo no qual a trama se passa). Além disso, as brincadeiras com a cultura pop soam divertidas e eficazes, transformando Batman em uma figura adoravelmente narcisista e trazendo Gandalf, Superman, Dumbledore, Michelangelo (o escultor), Michelangelo (a Tartaruga Ninja), Han Solo, Lando Calrissian e até mesmo Milhouse em pontas fabulosas.
Favorecido também pela ótima montagem David Burrows e Chris McKay (que conferem fluidez e agilidade à narrativa), Uma Aventura LEGO ainda traz consigo uma imaginação visual que se manifesta através das cores e de pequenos detalhes que, mais uma vez, evocam um aspecto mais infantil que é mais do que bem-vindo em uma obra como esta.
O resultado, portanto, é um longa que abre portas para uma franquia que parece promissora. E confesso que estou ansioso para assistir aos capítulos que virão a partir daqui.