A premissa de Oito Mulheres e um Segredo é bastante louvável: em tempos onde a inclusão e o empoderamento feminino estão cada vez mais em voga – como devem estar –, por que não reviver a franquia comandada por Steven Soderbergh (baseada num longa homônimo de 1960) trocando o gênero de seus protagonistas? Isto, por si só, é digno de nota – sim, colocar uma mulher para dirigir o projeto no lugar de Gary Ross (Jogos Vorazes) provavelmente resultaria em uma obra ainda mais interessante, mas a ideia de substituir onze, doze ou treze anti-heróis por oito anti-heroínas é curiosa. Infelizmente, assim que a projeção chega ao fim e as luzes do cinema se acendem, o filme que veio nas duas horas anteriores começa a desaparecer da memória do espectador com a mesma rapidez, o que indica que, na prática, Oito Mulheres e um Segredo não faz jus às suas boas intenções.
Roteirizado por Ross ao lado da estreante Olivia Milch, o longa começa com a golpista Debbie Ocean – irmã do Danny que, vivido por George Clooney, estrelou a trilogia anterior – saindo da cadeia e reiniciando suas atividades criminosas, formando um grupo com outras seis mulheres para executar um plano ousado: invadir o evento de gala que ocorre anualmente no Met e roubar um colar presente no pescoço de Daphne Kluger, uma celebridade emocionalmente instável e preocupada com futilidades. Se tudo der certo, as sete ladras sairão do assalto com nada menos que US$ 150 milhões para fracionar dentro do grupo.
Ou seja: Oito Mulheres e um Segredo nada mais é que uma refilmagem disfarçada de continuação – como Jurassic World, Star Wars: O Despertar da Força e Procurando Dory. A trama narrada aqui é basicamente a mesma que já foi contada em outros três filmes (quatro, se considerarmos aquele que inspirou a trilogia de Soderbergh) e vários momentos existentes no primeiro Onze Homens são recriados aqui, repetindo até mesmo a estrutura geral daquele longa (o prólogo na prisão é um exemplo disso). O problema, porém, é que a história está longe de ser das mais criativas: trata-se de… um assalto que acontecerá – e o roteiro sequer tenta conferir algum ar de novidade, desenvolvendo o tema de maneira inexpressiva e carente de ambição. Assim, se a ideia de conceder o protagonismo a um grupo de mulheres é admirável, o mesmo não pode ser dito sobre a trama preguiçosa e desinteressante que ocorre entorno delas.
Além disso, há um elemento fundamental em filmes de assalto (ou heist movies) que encontra-se ausente aqui: a atmosfera de urgência. Em nenhum instante sentimos que o esquema armado pelas anti-heroínas fracassará, já que elas simplesmente elaboram um plano e o executam sem maiores complicações – e se não há tensão no que está acontecendo, por que deveríamos nos importar? Para completar, o terceiro ato tropeça do ponto de vista estrutural ao subitamente inserir personagens que até então não haviam aparecido e adiar insistentemente o desfecho a fim de prolongá-lo com situações adicionais; não é à toa, inclusive, que existem uns três ou quatro momentos em que o filme poderia se encerrar, mas não o faz por pura teimosia.
Em compensação, se os esforços de Gary Ross como co-roteirista não são bem-sucedidos, ao menos ele se sai bem ao emular alguns traços estéticos presentes em vários projetos de Steven Soderbergh (Onze Homens, Magic Mike, Logan Lucky): embalado por uma trilha estilosa composta por Daniel Pemberton, o filme mantém um ritmo constantemente ágil, dinâmico e até meio agitado (mas nunca em excesso), investindo também em uma paleta de cores que complementa muitíssimo bem os ótimos figurinos projetados por Sarah Edwards. Já a montagem de Juliette Welfling confere vigor e energia ao andamento da história, embora exagere no número de cortinas verticais que servem para transitar de uma cena à outra.
Mas se há um elemento que realmente funciona em Oito Mulheres e um Segredo, este é sem dúvida o elenco: Sandra Bullock exibe um timing afiadíssimo ao expressar (em falas ou em pequenos gestos) a personalidade divertida de Debbie Ocean, que alterna com precisão entre a praticidade e o cinismo; Cate Blanchett aparece um pouco menos, mas desempenha bem a função de “integrante mais sensata do grupo”; e Anne Hathaway brilha ao encarnar Daphne Kluger como uma patricinha cujos privilégios não diminuem sua vontade de ter uma vida social menos glamourosa. As demais anti-heroínas, por outro lado, não se destacam tanto quanto essas três – e Helena Bonham Carter, em particular, continua fazendo questão de ostentar sua capacidade de interpretar, fazendo sua personagem soar não como uma pessoa, mas como… uma atriz atuando.
Contando com alguns momentos inspirados que provocam um sorrisinho no canto da boca do espectador, mas sem jamais levá-lo às gargalhadas entusiasmadas, Oito Mulheres e um Segredo é razoavelmente estiloso e divertido, mas carece de personalidade ou de qualquer elemento narrativo que engaje o suficiente. A sorte, no entanto, é que há um bom elenco ancorando o projeto como um todo.