Iniciada com uma produção que, mesmo entretendo moderadamente com hilárias interações entre personagens igualmente eficientes, era prejudicada por um falatório excessivo e desinteressante aliado a sequências de ação incompreensíveis que acabavam por transformar o que prometia ser um dos melhores “filmes de brucutus” de todos os tempos num longa-metragem genérico e apenas razoavelmente palatável, a franquia Os Mercenários alcançou seu ápice em 2012 com um segundo filme divertido e cujo grande mérito foi justamente se dedicar à idealização de uma imensa galhofada semelhante até mesmo à uma sátira aos filmes de ação oitentistas. Por isso, é uma pena constatar que este terceiro capítulo, pelo visto, dá ouvidos aos comentários negativos desferidos contra o filme anterior e, assim, acabe investindo da forma mais dispensável e exagerada possível numa seriedade que, quando unida aos princípios da franquia, resulta numa obra terrivelmente desequilibrada e indecisa quanto ao tom que adotará.
Novamente escrito pelo astro Sylvester Stallone, desta vez com a parceria de Creighton Rothenberger e Katrin Benedikt, Os Mercenários 3 se inicia com os expendables comandados por Barney Ross tirando um velho e desconhecido membro do esquadrão da prisão, e logo na primeira missão que o time realiza, um dos integrantes é gravemente ferido por Conrad Stonebanks, um co-fundador da equipe que aparentava ter sido morto pelo líder depois de ter sido corrompido ao investir no tráfico de armas. Com isso, Barney decide abandonar seus companheiros para formar uma nova equipe e, assim, assassinar Stonebanks com maior segurança. Mas nada é tão fácil quanto parece, e depois que um agente da CIA ordena que o criminoso seja capturado com vida pelos mercenários, o grupo passará por grandiosas dificuldades para ao menos tentar conter o vilão caso isso seja possível.
Chega a ser impressionante como o saldo geral deste terceiro filme é frustrante quando consideramos que a película é iniciada de maneira mais que apropriada, se abrindo com uma ótima sequência de ação seguida pelas baboseiras que transformaram o filme anterior numa diversão tão eficiente, como um homem removendo sua barba com o uso de um facão. Igualmente agradável é ver que, ao contrário dos antecessores, Os Mercenários 3 não perde tanto tempo de seus primeiros minutos com diálogos desinteressantes – algo que prejudicou profundamente o primeiro filme e o ato inicial do longa anterior. Depois de se assumir, em tese, como uma irreverência, o longa nos traz a uma tragédia que acarreta na alteração radical do tom da narrativa, que deixa de ser uma espécie de paródia dos filmes de brucutus para ganhar nuances mais dramáticas; e o mais admirável é ver como o roteiro e a direção de Patrick Hughes são habilidosos no estabelecimento desta transição.
Mas é a partir aí que a narrativa do filme perde o rumo e se choca contra o que parece ser uma parede de concreto e permanece imóvel, se entregando ao falatório chato dos dois longas anteriores e se transformando num filme de ação pavorosamente monótono. E como já foi dito no parágrafo anterior, o grande problema deste terceiro episódio da franquia reside no fracasso por trás da tentativa de conciliar uma seriedade acentuada com a irreverência do filme anterior, o que acaba implicando numa carga dramática importuna ilustrada junto a exposições da mais absurda fantasia que se pode imaginar num longa-metragem de ação. Como se não bastasse, os efeitos especiais seguem aparentando ter saído de um aplicativo para celulares, e se isso já causava indignação em Os Mercenários 2, aqui gera um transtorno ainda maior quando consideramos que a produção adotou um tom mais dramático que impossibilita uma descontração tão fortalecida. Assim, Os Mercenários 3 acaba sendo um filme de ação sério, porém mal escrito, precário e exagerado cujo senso de humor é incorreto e exibido nos momentos menos apropriados; esta última característica ainda é agravada pelo insuportável mercenário vivido por Antonio Banderas, que serve como um alívio cômico chato e que, além de fracassar como personagem de ação (é difícil acreditar que um indivíduo como ele seria tão eficaz em combate), ainda conta com uma carga dramática absolutamente descartável.
Além disso, Os Mercenários 3 ainda é prejudicado pela estúpida decisão de se adequar à uma faixa etária mais nova (PG-13) a fim de atingir um público mais amplo. Com isso, os palavrões mais graves são pouquíssimos (ao menos um favor se deve à Fox, que provou com X-Men: Primeira Classe, Wolverine – Imortal e Dias de um Futuro Esquecido que um “fuck” não é suficiente para fazer um filme ser restrito aos mais velhos) e o sangue é limado, o que naturalmente acaba abalando constantemente as sequências de ação, pois não importa quantos tiros sejam disparados a partir de armas portentosas, jamais veremos um único sangramento em razão de tais ferimentos – o que quase nos leva a crer que o soco de Sylvester Stallone é mais perigoso que o disparo de uma bala. Como se não bastasse, a brutalidade diluída ainda acaba agindo contra a própria proposta da produção por se distanciar da violência dos filmes de ação oitentistas e abraçar um tom mais abrangente assim como (oh, céus) RoboCop 3.
Se rendendo aos atuais costumes das franquias cinematográficas mais lucrativas de Hollywood, Os Mercenários 3 ainda comete o magnânimo erro de apostar na criação de uma nova equipe de expendables, mais jovem e modernista para firmar um futuro esperançoso para a cinessérie. Contudo, é lamentável ver que essa “jovem guarda” de mercenários é composta pelos mais apáticos dos heróis, deixando claro que os novos personagens são incapazes de manter uma franquia marcada por nomes como Sylvester Stallone, Jason Statham, Terry Crews, Dolph Lundgren, Bruce Willis, Arnold Schwarzenegger, Wesley Snipes, Harrison Ford e outros astros de peso. Como se a inexistência de uma única razão minimamente satisfatória para que Barney abandone seu velho esquadrão para procurar novos rostos não fosse incômodo o suficiente, o fato destes novos heróis serem compostos por estereótipos modernistas (o que é conceitualmente aceitável, visto que os mercenários originais também seguiam os mais óbvios estilos de suas épocas) faz com que sejamos incapacitados de simpatizar com aquelas figuras, pois estas representam uma visão míope acerca da geração atual: aquela que diz que os jovens de hoje são os seres mais alienados que se possa encontrar – e quando o roteiro decide trazer um choque de gerações, o constrangimento é inevitável.
Depois do vexame que passou em Transformers 4, Kelsey Grammer surge num papel satisfatoriamente divertido, mas que não se compara ao excelente personagem vivido por um Wesley Snipes cheio de carisma e convicção (há uma referência visual a O Demolidor sutil, mas interessante). Mas ao mesmo tempo em que Harrison Ford se entretém, Arnold Schwarzenegger e Jet Li são desperdiçados em papeis insignificantes e que existem apenas para marcar presença, ao passo que Mel Gibson se transforma no grande atrativo do filme e pontua cada nuance de Stonebanks da maneira ideal, saindo do sarcasmo e chegando à insanidade que, unidas, formam inteiramente a personalidade do vilão. E não é só: além das motivações de Stonebanks serem razoavelmente profundas, Gibson é perfeito ao exemplificar toda a maldade raivosa, irônica e louca do personagem através de seu tom de voz ameaçador e de suas expressões compostas por sorrisos sádicos e olhares insanos.
Contando com uma boa trilha incidental de Brian Tyler, Os Mercenários 3 decepciona não apenas por se encontrar num nível notavelmente inferior ao dos seus antecessores, mas por contar com alguns acertos interessantes e bons momentos. Pena que estes não sejam tão valorosos diante dos tropeços desastrosos e numerosos que infelizmente marcam esta continuação pasteurizada e, acima (ou abaixo?) de tudo, entediante. Se Os Mercenários 2 agradava por nos mostrar os “velhinhos” (sem querer usar tal termo pejorativamente) se divertindo com as memórias de um passado agradável e deliciosamente irreverente, agora a impressão que fica é que esta brincadeira ficou muito mais interna e restrita apenas a esses indivíduos.