Animais Fantásticos e Onde Habitam

Título Original

Fantastic Beasts and Where to Find Them

Lançamento

17 de novembro de 2016

Direção

David Yates

Roteiro

J.K. Rowling

Elenco

Eddie Redmayne, Katherine Waterston, Dan Fogler, Alison Sudol, Colin Farrell, Carmen Ejogo, Samantha Morton, Ezra Miller, Jon Voight, Ronan Raftery, Josh Cowdery, Faith Wood-Blagrove, Jenn Murray, Ron Perlman e Johnny Depp

Duração

133 minutos

Gênero

Nacionalidade

Inglaterra

Produção

J.K. Rowling,

Distribuidor

Warner Bros.

Sinopse

Um excêntrico magizoologista carrega uma maleta cheia de animais mágicos coletados durante suas viagens pelo mundo. As criaturas acabam saindo de sua mala em Nova York, e agora ele precisa usar suas habilidades para capturá-las.

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Animais Fantásticos e Onde Habitam | Crítica

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A ideia de voltar ao universo mágico concebido por J.K. Rowling em Harry Potter (e transportado aos cinemas por Chris Columbus, Alfonso Cuarón, Mike Newell e David Yates) anos após As Relíquias da Morte – Parte II encerrar a saga, deixando saudades em legiões inteiras de potterheads, é naturalmente tentadora – ainda mais se levarmos em conta que, embora já conheçamos aquele mundo mágico de cabo a rabo graças a outros sete livros e oito filmes (fora todos os outros materiais adicionais, de games a peças teatrais), desta vez teremos a oportunidade de revisitá-lo a partir de uma ótica totalmente nova, nos levando a outra época (saindo dos anos 1990/2000 e regressando a 1926), a outro país (saindo de Londres e embarcando em Nova York) e a outros personagens (saem os bruxinhos de Hogwarts e entram os agentes do Congresso da Magia dos Estados Unidos). Em teoria, nada poderia ser melhor do que experimentar a nostalgia de retornar ao mundo de Harry Potter e, ao mesmo tempo, sentir o frescor de redescobri-lo sob perspectivas inéditas.

E é uma pena que Animais Fantásticos e Onde Habitam se revele uma experiência tão decepcionante, exibindo apenas lampejos ocasionais do encantamento que nos habituamos a experimentar na franquia anterior.

Marcando a estreia de J.K. Rowling como roteirista, este Animais Fantásticos comprova de forma inequívoca as diferenças (que deveriam ser óbvias) entre uma narrativa concebida para o Cinema e outra, para a Literatura: se um livro permite que o leitor tenha todo o tempo do mundo para consumi-lo e para saborear com calma cada passagem da história, tornando mais aceitável ou natural a presença de digressões e de capítulos inteiros que falem mais sobre si mesmos do que sobre a trama que os engloba, um roteiro cinematográfico é dotado de ritmo e cadência condizentes com uma narrativa que se desenrole de maneira contínua e fluída ao longo de algumas horas (diferente de uma série, composta por episódios a serem vistos um de cada vez), tornando mais notório quando há elementos descartáveis.

Com isso, o que se conclui aqui é que J.K. Rowling pode ser uma ótima escritora (só li até o quarto livro, O Cálice de Fogo, mas gostei muito do que acompanhei até ali), mas isto não necessariamente a qualifica como uma boa roteirista – e, ao longo de todo este filme, o que vemos é uma história não só desinteressante, mas esquemática e episódica, como se cada momento constituísse um capítulo de livro que se costurasse aos demais de maneira frouxa e carente de coesão. Da mesma forma, se a trama central (que acompanha o magizoologista Newt Scamander, o “trouxa” Jacob e as agentes Tina e Queenie em busca dos tais animais fantásticos do título espalhados por Nova York) não parece ser das mais ambiciosas, ao menos poderia render algo instigante ou divertido se não fosse o tempo todo interrompida pelo arco secundário envolvendo o jovem Creedence, o chefão dos agentes bruxos Percival Graves e uma força maligna identificada como “Obscurus” – um arco cuja única função é preparar terreno para os próximos filmes da saga, impedindo que este primeiro se desenvolva por conta própria.

Mas o mais frustrante em Animais Fantásticos é perceber como a direção de David Yates não só acentua a sensação de que cada momento da narrativa é um “episódio” isolado, como ainda piora a situação ao conferir a cada um destes capítulos tons e atmosferas completamente distintas entre si, fazendo-os soarem ainda mais incompatíveis uns com os outros e jamais encontrando um equilíbrio razoável entre os instantes de leveza e o peso das passagens mais sombrias: aqui, Newt está rolando e imitando de forma engraçadinha um hipopótamo num parque a fim de conduzi-lo de volta à sua maleta; ali, um jornalista é obrigado a testemunhar a morte brutal do filho, candidato a senador, em meio a um evento público; acolá, os heróis protagonizam uma cena bem humorada em uma taverna repleta de duendes; logo em seguida, voltamos a nos concentrar em Creedence e nos distúrbios que adquiriu depois de uma vida inteira de abusos e violências. É como se Yates tentasse mesclar o encantamento lúdico que Chris Columbus impôs aos dois primeiros Harry Potter e a atmosfera sombria e abertamente política dos últimos que ele mesmo dirigiu, mas carece da habilidade de Alfonso Cuarón ao começar a costurar a transição entre uma abordagem e outra (naquele que permanece como o melhor exemplar de toda a série, O Prisioneiro de Azkaban).

Esta falta de energia, aliás, se estende à maioria dos personagens que povoam a narrativa e que em momento algum são cativantes como Harry Potter, Hermione Granger, Ron Weasley, Albus Dumbledore, Rubeus Hagrid, Neville Longbottom, Minerva McGonagall, Sirius Black ou Severus Snape. Em vez disso, temos Newt Scamander, um protagonista que nem o próprio filme parece entender muito bem: ora ele surge como um gênio de sua área e preparado para qualquer evento inoportuno que apareça em seu caminho, ora ele se comporta como um bobão atrapalhado que nada consegue manter sob controle, variando de acordo com as necessidades imediatas do roteiro. Em compensação, Dan Fogler retrata Jacob como um indivíduo não só engraçado em suas tentativas de humor, mas profundo nos instantes que sugerem uma ambição dramática maior de sua parte, dividindo uma boa química com a também eficiente Alison Sudol. E se Katherine Waterston tem a oportunidade de estrelar ao menos um momento emocional que funciona, quando demonstra seu apego por Newt nos minutos finais da projeção, Ezra Miller confere peso e complexidade notáveis a Creedence, fazendo os traumas e as inseguranças do personagem soarem como fatores que de fato o quebraram por completo (e é uma pena que, como já comentei, todo o arco envolvendo o garoto pareça deslocado da trama principal, sendo encaixado à força para nos preparar para os próximos filmes), ao passo que Colin Farrell faz o que pode com o pouco que tem em mãos, sugerindo alguma ameaça mesmo que seus esforços sejam sabotados pela falta de presença do vilão.

Pois o fato é que os personagens mais interessantes de Animais Fantásticos, no fim das contas, acabam sendo os bichos que habitam o interior da maleta de Newt Scamander – e, por mais que o filme eventualmente se perca ao exagerar no humor que extrai deles (vide a constrangedora cena do hipopótamo no zoológico), é difícil resistir à fofura da plantinha que exibe extremo apego ao seu dono, à solenidade da imensa águia que surge de tempos em tempos e, principalmente, às trapalhadas do ornintorrinco/porquinho-da-índia cleptomaníaco. Do ponto de vista técnico, inclusive, o filme pode tropeçar constantemente nos efeitos digitais artificiais que compõem estas criaturas e vários dos cenários ao redor delas, mas se destaca graças à inventividade dos designs daqueles animais e, não menos importante, do trabalho dos designers de produção Stuart Craig e James Hambidge, que combinam inteligentemente a reconstituição (perfeita) da Nova York dos anos 1920 e os detalhes fictícios que surgem da contextualização dos bruxos naquele universo. Aliás, a forma com que David Yates articula a relação daquela cidade real com as magias componentes daquele mundo particular, resultando numa ambientação específica e eficiente, denota um raro vestígio de inventividade que falta a todo o resto do projeto.

Agraciado pelos figurinos de Colleen Atwood (colaboradora de longa data de Tim Burton), que, como de costume, propõe uma união precisa entre o fabulesco e o mundano (algo que, de novo, mostra-se condizente com a proposta geral de Yates), Animais Fantásticos e Onde Habitam não é um filme ruim – mas se tivesse sido lançado em 2001 no lugar de Harry Potter e a Pedra Filosofal, dificilmente teria resultado em uma saga tão longeva, influente e amada quanto aquela.

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