Em Ritmo de Fuga

Título Original

Baby Driver

Lançamento

27 de julho de 2017

Direção

Edgar Wright

Roteiro

Edgar Wright

Elenco

Ansel Elgort, Lily James, Kevin Spacey, Jamie Foxx, Jon Hamm, Eiza González, Jon Bernthal e CJ Jones

Duração

113 minutos

Gênero

Nacionalidade

EUA

Produção

Nira Park, Tim Bevan e Eric Fellnar

Distribuidor

Sony Pictures

Sinopse

O jovem Baby (Ansel Elgort) tem uma mania curiosa: precisa ouvir músicas o tempo todo para silenciar o zumbido que perturba seus ouvidos desde um acidente na infância. Excelente motorista, ele é o piloto de fuga oficial dos assaltos de Doc (Kevin Spacey), mas não vê a hora de deixar o cargo, principalmente depois que se vê apaixonado pela garçonete Debora (Lily James).

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Em Ritmo de Fuga | Crítica

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Após se aliar à dupla Simon Pegg e Nick Frost ao criar a chamada “trilogia do Cornetto” (formada pelos ótimos Todo Mundo Quase MortoChumbo Grosso e Heróis de Ressaca), o cineasta também realizou o excepcional Scott Pilgrim Contra o Mundo e se consolidou como uma das grandes revelações que o gênero “comédia” testemunhou nos anos 2000. Dono de um senso de humor que não necessariamente faz rir, mas leva o espectador a apreciar as boas ideias que são apresentadas ao longo das produções, Wright usufrui de todos os aspectos técnicos presentes na linguagem cinematográfica para gerar graça, desde a montagem frenética até os movimentos de câmera estudados, passando também pelo design de som inteligente e pelas referências certeiras à cultura pop.

Em Baby Driver (pavorosamente traduzido como Em Ritmo de Fuga), o que Edgar Wright faz é elevar todas as suas habilidades a um novo patamar, resgatando as suas marcas registradas a fim de criar uma história estilosa e autoral. Não que a trama em si seja das mais inventivas: escrito pelo próprio Wright, o roteiro gira entorno de Baby, um jovem que emprega os seus talentos extraordinários como motorista para acompanhar missões criminosas, ajudando assaltantes de banco na hora de fugir da polícia. Independente de ser uma premissa original ou não, o fato é que isto é irrelevante, pois o que realmente importa é a forma como a obra abordará este tema.

Dito isso, o primeiro elemento que torna Em Ritmo de Fuga digno de aplausos é a decupagem (processo que planeja a transição do roteiro pro audiovisual): exibindo uma disciplina presente do primeiro ao último instante, Edgar Wright elabora um filme onde cada plano parece ter sido calculado detalhadamente antes de ser rodado, estabelecendo uma união primorosa entre o design sonoro e a montagem – algo que fica evidente logo nos primeiros segundos da projeção, onde as batidas de uma música guiam os cortes que introduzem os personagens dentro de um carro. Essa dinâmica não só é mantida ao longo das quase duas horas que vêm à frente como também se fortalece cada vez mais, usando sempre o som como base para quaisquer escolhas que Wright e os montadores Jonathan Amos e Paul Machliss farão no decorrer do projeto.

O grande desafio, no entanto, é que a maioria das canções que surgem em Em Ritmo de Fuga não foram criadas para o longa, então a direção e a montagem são obrigadas a seguir o ritmo das músicas em vez de seguir o caminho contrário (que é o mais comum, pois trilhas originais costumam ser compostas depois que o filme já está montado). Assim, os tiros disparados pelos capangas de um traficante de armas são sincronizados com o som extra-diegético; Baby se movimenta de acordo com a canção que está ouvindo, cantando e dançando; e quando o protagonista quebra a janela de um carro, o barulho do vidro se quebrando “interrompe” o alto volume de uma composição. Além disso, a mixagem de som é hábil ao brincar com a diegese das músicas escutadas por Baby, que soam mais altas quando o personagem usa os dois fones de ouvido e se tornam mais baixas quando apenas um lado está operante. Já a montagem também tem outros méritos, concebendo momentos fabulosos como o raccord que associa o ciclo de uma lavanderia às rodadas de um disco numa vitrola e o corte de fusão que vai do plano-detalhe dos óculos escuros de Baby até a imagem de um carro sendo refletida numa vidraça.

De todo modo, quem se destaca mesmo é o diretor Edgar Wright (que merece prêmios por seu trabalho aqui): oferecendo ao projeto uma identidade que o torna especialmente memorável, o realizador continua investindo em recursos costumeiros como os zooms rápidos, os planos-detalhe e as transições elegantes que aproveitam itens cruzando a tela para saltar de uma cena para outra. Isso sem contar, é claro, as tradicionais referências a filmes, séries e músicas, desde as máscaras de Austin Powers até as alusões a Clube da Luta e Monstros S.A. (e quando um restaurante chamado Goodfellas entra na história, percebemos que o nome não deve ter sido escolhido por acaso). É possível dizer, portanto, que Baby Driver traz Edgar Wright sendo mais Edgar Wright do que nunca, o que dá origem a uma narrativa de crime que conta com uma personalidade própria e irresistível – aliás, vou confessar que, durante a projeção, pensei nas primeiras obras de Quentin Tarantino, que também desenvolviam histórias estilosas que giravam entorno de assaltantes e gangsteres (me refirmo a Cães de Aluguel Pulp Fiction).

O mesmo cuidado pode ser observado nas excelentes sequências de ação, que são conduzidas de maneira enérgica e estão sempre exercitando a criatividade de seus realizadores (quando a frente de um carro surge presa embaixo de um caminhão, fiquei animado ao constatar que eu dificilmente tinha visto algo parecido em outras produções). Explosivas e dinâmicas do começo ao fim, as perseguições, tiroteios e correrias acontecem sob a luz do dia e são reveladas a partir de planos abertos que facilitam a compreensão do espectador, sendo também uma surpresa que a ação jamais seja prejudicada pelos cortes rápidos mesmo que estes existam. Por outro lado, a cautela de Wright permite que o diretor rode planos mais longos, como aquele que mostra Baby fazendo comida numa cozinha ou o plano-sequência que ocorre ainda nos primeiros minutos do longa (e que mantém uma coesão com o resto da filmografia do cineasta, já que, em Todo Mundo Quase Morto, Wright também criou um plano parecido no início do filme).

Transformando-se num espetáculo visual ainda mais poderoso graças à fotografia de Bill Pope (Matrix e Homem-Aranha 2), que aposta numa paleta de cores saturadas e intensas que se contrapõem brilhantemente às sequências em preto e branco que ilustram os sonhos do protagonista, Em Ritmo de Fuga é embalado por uma trilha sonora composta primordialmente por ótimas músicas (esteja preparado para se viciar em mais uma playlist do Spotify); mas é claro que essas não seriam de grande serventia se fossem simplesmente jogadas de graça. Felizmente, este é um caso onde a seleção de canções está presente para complementar o tom da narrativa e – o mais importante – enriquecer o personagem principal, que utiliza a linguagem musical como um apoio para enxergar a realidade com mais clareza (e isso não diz respeito apenas ao conteúdo de seu iPod, já que Baby faz questão de gravar praticamente tudo o que acontece em sua vida para fazer remixes e salvá-los em fitas que ganham nomes como “Mãe” e “Deborah”).

Desta forma, a performance de Ansel Elgort é fundamental para que o anti-herói funcione: mantendo um semblante neutro na maior parte do tempo, o ator consegue transformar Baby numa figura mais profunda que o esperado, empregando a inexpressividade a fim de indicar o quão distraído é o personagem. Em contrapartida, Baby parece ganhar uma vida nova sempre que escuta uma canção, entregando-se a danças e cantaroladas entusiasmadas quando põe uma música para tocar; e, aqui, Elgort se sai surpreendentemente bem ao ritmar sua interpretação corporal de acordo com as composições que ouve. Para completar, o ator é certeiro ao retratar Baby como um sujeito excepcional naquilo que pratica sem que se torne convencido ou arrogante, algo que automaticamente afastaria o público – em vez disso, Baby surge como um garoto que, apesar das ações criminosas que realiza, se recusa a prejudicar gravemente os inocentes e exibe uma ingenuidade característica da juventude.

Já o elenco de apoio é bem-sucedido ao conceber uma galeria de coadjuvantes bastante divertidos: Kevin Spacey soa como uma ameaça iminente ao mesmo tempo em que, de vez em quando, quase parece disposto a acolher (ou deixar de massacrar) Baby; Jamie Foxx transforma Bats num vilão intimidador, levando o público a gostar de odiá-lo; Eiza González e Jon Hamm formam uma dupla interessante, com este segundo se convertendo numa espécie de Exterminador do Futuro no terceiro ato; e até mesmo Jon Bernthal, com o pouco tempo que tem, consegue divertir como o psicopata que se habituou a interpretar. Ainda assim, é Lily James quem se sobressai entre os coadjuvantes, que vive Deborah com uma singeleza fascinante e deixa claro o motivo do protagonista ser tão atraído por ela: a jovem apenas conta com uma personalidade incrivelmente magnética e carismática.

Fortalecido por um roteiro que compreende as suas próprias ambições e não tenta se complicar mais que o necessário, sabendo estabelecer uma narrativa engajante e diálogos afiadíssimos (as conversas entre o protagonista e Deborah são apaixonantes), Em Ritmo de Fuga se une a Scott Pilgrim Contra o Mundo como um dos melhores títulos da filmografia de Edgar Wright, tornando-se mais uma prova de que os filmes de ação merecem ser valorizados em vez de tratados como um Cinema “menor”. Num mundo ideal, o novo trabalho de Wright seria um franco favorito às premiações de fim de ano desde já.

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