Para um filme centrado num herói cujo poder é a supervelocidade e que traz ninguém menos que Jim Carrey como vilão, Sonic 2 se revela incrivelmente insosso, disperso e – o mais irônico – monótono, arrastando a passos de tartaruga uma narrativa inchada, que carece da agilidade de seu protagonista e que busca desesperadamente por alguma situação que justifique o interesse ou o divertimento do público. Sim, há dois ou três momentos nos quais o longa consegue provocar um risinho de canto de boca, mas estes são contrabalanceados com inúmeros outros nos quais a única reação que sobra para o espectador é… a de profundo tédio.
Novamente dirigido por Jeff Fowler (que estreou na função justamente no filme anterior), Sonic 2 começa alguns meses após os eventos do longa passado, com um solitário Dr. Robotnik preso numa dimensão paralela repleta de cogumelos gigantes (acalmem-se: isto não implica em qualquer crossover aparente com um certo encanador italiano) e com Sonic levando uma vida descompromissada na Terra, morando na casa do casal Wachowski numa cidadezinha no interior de Montana enquanto sai à noite para bancar o super-herói nas metrópoles vizinhas (sob a alcunha de “Justiça Azul”). Tudo muda, porém, quando Robotnik encontra um jeito de retornar à dimensão do ouriço, desta vez contando com a ajuda de Knuckles, uma equidna vermelha pertencente a uma antiga tribo rival da família de Sonic. Para ajudar o protagonista, surge o simpático Tails, uma raposa amarela capaz de voar e de construir um monte de gadgets que serão úteis e eficazes na jornada.
Infelizmente, se a princípio Sonic 2 parece se tratar de uma aventura divertida e dinâmica sobre bichos fantásticos que se juntam para combater um supervilão excêntrico, na prática o diretor Jeff Fowler e os roteiristas Pat Casey, Josh Miller e John Whittington demonstram um interesse quase nulo pelos personagens mágicos que têm em mãos, priorizando, em vez disso, as tentativas de humor bestas dos humanos interpretados por James Marsden, Tika Sumpter, Shemar Moore, Natasha Rothwell, Adam Pally, Lee Majdoub, Tom Butler, etc, etc, etc. Assim, em vez de se preocupar em contar com o mínimo de coesão uma historinha que se resolveria facilmente com uma hora e meia, os realizadores preferem interromper o ritmo da narrativa (a ponto de fazê-la atingir exagerados 122 minutos de projeção) e perder tempo criando uma penca de subtramas e situações que, além de dispensáveis, são prolongadas ao máximo possível, como se desafiassem o espectador a suportá-las (não basta Marsden e Sumpter viajarem às Bahamas; é preciso que eles sejam padrinhos de um casamento, que este seja arruinado pela aparição surpresa de Sonic e Tails, que todos sejam presos, que a noiva fique transtornada e vá estrelar uma cena engraçadinha na qual se “vinga” do noivo, que os dois se reconciliem, que… enfim).
O problema destas situações (que, de novo, ocupam um considerável tempo de tela) nem está no fato de serem dispensáveis e atrapalharem o andamento da história, mas no fato de simplesmente não terem a menor graça, já que os roteiristas não parecem ter o mínimo interesse em elaborá-las além do primeiro rascunho de piada que lhes veio à mente (uma coisa é surpreender com uma tirada envolvendo o Soldado Invernal; outra é apenas mencionar o nome daquele personagem e achar que isso, por si só, deveria me fazer rir) e a direção de Jeff Fowler é incapaz de conferir timing ou imaginação a nada no longa. Aliás, o mesmo se aplica às sequências de ação, que, de modo geral, nem tentam aproveitar as especificidades de cada personagem ou ilustrar os poderes do protagonista de forma visualmente criativa, mostrando-se genéricas e aborrecidas – e a falta de interesse do cineasta (e do filme) pelo próprio Sonic é tão gritante que, em várias ocasiões, cheguei a esquecer temporariamente que o superpoder do herói era a velocidade (quando ele eventualmente voltava a correr, eu lembrava: “Ah, sim, ele corre”).
A sorte, porém, é que Sonic 2 conta com a presença do gênio Jim Carrey, que, ainda mais solto que no primeiro filme, resgata a extraordinária fisicalidade pela qual se notabilizou nos anos 1990 e transforma o Dr. Robotnki numa persona simplesmente irresistível, sugerindo malícia, entusiasmo ou frustração a partir dos movimentos mais sutis (de uma inclinação óbvia no torso a uma tremida rápida na sobrancelha) e conseguindo extrair o riso através das inflexões que emprega ao recitar cada sílaba das palavras que lhe saem da boca – e o fato de o visual do Dr. Robotnik estar mais próximo ao original dos games (cabeça careca; bigode imenso e estufado; roupão vermelho; etc) obviamente ajuda a torná-lo ainda mais hipnótico. E se Ben Schwartz faz o que pode para trazer vitalidade e irreverência a Sonic, saindo-se relativamente bem com o parco material que lhe é concedido, Idris Elba empresta sua voz a Knuckles e, com isso, quase rouba o filme (junto de Carrey), já que a imponência e a solenidade sugeridas pelo timbre assombrosamente grave do ator são o tempo todo quebradas pela burrice e pela postura obtusa do personagem, ao passo que Colleen O’Shaughnessey interpreta Tails como… bom, como uma raposinha fofinha que provavelmente venderá muitos bonecos no McDonald’s.
Melhorando levemente em seu terceiro ato (quando já é tarde demais para apagar ou diminuir o sentimento de vazio que o antecipou por quase duas entediantes horas), Sonic 2 é, em suma, um filme que jamais encara seu protagonista como um personagem especial, fora do comum: tanto as cenas de ação quanto as tentativas de humor poderiam perfeitamente girar em torno de qualquer outro bichinho genérico. O fato de se tratar especificamente do famoso ouriço azul criado pela SEGA, no fim das contas, é um mero detalhe de merchandising.
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(Lembre-se: a pandemia não acabou. Se for sair de casa e ir ao cinema, siga todos os cuidados sugeridos pelas organizações sérias de Saúde: use máscara, mantenha uma distância segura dos demais espectadores, evite se aglomerar e – o mais importante – vá ao posto tomar sua vacina. Se já tomou a primeira dose, tome a segunda. Se já tomou a segunda e já chegou a vez de tomar a terceira, tome a terceira – se ainda não chegou, espere e vá assim que ela estiver disponível. É triste ter que escrever isto, mas… não escute o atual presidente da República (ou mesmo seu ministro da Saúde): vacine-se e proteja-se. #ForaBolsonaro)