Menina de Ouro

Título Original

Million Dollar Baby

Lançamento

11 de fevereiro de 2005

Direção

Clint Eastwood

Roteiro

Paul Haggis

Elenco

Clint Eastwood, Hilary Swank, Morgan Freeman, Brian O’Byrne, Margo Martindale, Lucia Rijker e Bruce MacVittie

Duração

132 minutos

Gênero

Nacionalidade

EUA

Produção

Clint Eastwood, Albert S. Ruddy, Tom Rosenberg e Paul Haggis

Distribuidor

Europa Filmes

Sinopse

Frankie Dunn é um veterano treinador de boxe de Los Angeles que mantém quase todos a uma certa distância, exceto o velho amigo e sócio Eddie Dupris. Quando Maggie Fitzgerald, uma operária transferida de Missouri, chega ao ginásio de Frankie em busca de sua experiência, ele fica relutante em treinar a jovem. Mas quando cede ao seu jeito reservado, os dois formam um vínculo muito próximo que inevitavelmente mudará suas vidas.

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Menina de Ouro | Crítica

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Menina de Ouro é um filme que empolga por criar esperanças e, depois, dilacera por mostrar como todas essas esperanças estão condenadas à dor, ao fracasso e à escuridão. É uma obra que se utiliza brilhantemente de suas bases melodramáticas a fim de discutir várias questões simultâneas: paternidade, crença, frustração, luto em vida e até eutanásia – e é impressionante que consiga ser exemplar em cada uma dessas esferas. Talvez seja meu longa favorito dentre os dirigidos por Clint Eastwood (se não for, é um dos três finalistas).

A relação entre Frankie (Eastwood) e Maggie (Swank) se forma numa dinâmica de pai-e-filha que nasce dos vazios de cada um: o primeiro é um pai sem filhos, um sujeito que luta para reestabelecer um mínimo de contato com a filha (que nunca vemos) e que há anos envia cartas sem jamais ser correspondido; a segunda é uma mulher sem parentes, que agora batalha para sobreviver e se sustentar sem poder contar com qualquer amparo familiar. Pois a verdade é que, no fim das contas, a relação mais genuína de pai-e-filha que poderia surgir era entre Frankie e Maggie mesmo, rompendo qualquer “necessidade” que não há) de laço biológico entre os dois; quem mais merece ser chamado de “família” pela boxeadora é o seu treinador, ao passo que o indivíduo que melhor se encaixa na categoria de “família” para o treinador é… sua boxeadora. É aquilo: pai é quem cria.

E é uma relação que respeita muito as personalidades de cada um: se Clint Eastwood compõe Frankie como um indivíduo distante, reservado e pouco gentil, faz todo o sentido que o personagem tenha, como reação inicial à chegada de Maggie, se fechar completamente, se recusar a embarcar na jornada da mulher (por ela ser… mulher, de fato, mas também, convenhamos, por um medo lá no fundo de acabar virando a figura paterna de uma nova “filha”). Já Hillary Swank retrata Maggie como uma explosão de energia e vitalidade, como uma moça que exala vida e movimento a cada respiro que dá – e mais: que pouco se importa com qualquer obstáculo que surja em seu caminho (o fato de ser mulher a torna alvo do machismo típico da indústria – e, sim, do próprio Frankie a princípio – e a sua idade, 30 e poucos anos, supostamente a torna “velha demais” para uns). Um não quer se arriscar virar pai, a outra não tem outra opção a não ser virar filha.

Mas a tragédia de Menina de Ouro está sempre à espreita, mesmo que, na maior parte do tempo, o filme jogue nossas esperanças lá em cima e nos deixe entusiasmados com os rumos que a carreira de Maggie vem tomando. Durante mais da metade da projeção, a boxeadora parece praticamente invencível; qualquer luta que ela disputa termina com ela vencedora. Aliás, a forma como Eastwood filma esses embates faz mais do que jus à riqueza das descrições feitas por Scrap (Freeman) em sua narração em off – e poucas vezes vi uma narração em off ser tão bem empregada quanto aqui, já que não só oferece uma quantidade impressionante de detalhes/significados sobre o esporte em si (o que só aumenta o seu impacto), como também começa soando quase como uma “voz de Deus” apenas para, pouco depois, se revelar a voz de Scrap, um indivíduo com tantas cicatrizes e machucados que, por isso mesmo, se torna o narrador perfeito para uma história como essa.

E é por Maggie passar a maior parte do filme sendo tão indestrutível que, quando chega o momento de sua queda, essa se torna infinitamente mais impactante e dolorosa do que já seria. É pelo contraste que o horror daquela tragédia se intensifica – e é justamente por Hillary Swank conferir tamanha energia e dinamismo à personagem que vê-la paralisada, numa cama de hospital, se torna ainda mais angustiante. Como pode, uma mulher tão ágil, tão empolgada e tão intensa terminar respirando por aparelhos e sem poder mover nada abaixo do pescoço? É um contraste triste demais.

(A propósito: gosto muito, também, de como Eastwood tem uma visão bem direta sobre os arquétipos que passam pela trama. A Ursa Azul, em especial, é uma vilã (sim, vilã) extraordinária precisamente por não ter tons de cinza; ela apenas é uma força da natureza movida pela sede de destruição na base do golpe baixo, pela vontade de esmigalhar sem moral nem ética – notem os sorrisinhos perversos que ela troca com seu empresário antes de massacrar Maggie.)

Ao fim, o destino da boxeadora soa tão cruel, tão antinatural e, principalmente, tão incompatível com o que ela era antes que, para Frankie, a melhor forma de cuidar dela é… libertando-a. O que sobrou para Maggie não é vida. E o que restou a Frankie, como pai, é fazer a vontade da filha (sem aspas) que conquistou no meio do caminho. Não deixa de ser curioso – e apropriado – que a primeira vez que o padre da igreja de Frankie o escuta com um pouco mais de empatia e paciência seja ao tratar do destino de Maggie, de como sobreviver (naquela condição) tornou-se um calvário para ela. Que Maggie parta aos 33 anos é uma reafirmação da crença de seu diretor.

Ele segue devoto à sua fé, mas não vê contradição em admitir que viver do jeito que Maggie vive, no final, é mais castigo do que dádiva. Mais uma vez, Clint Eastwood se mostrando bem mais progressista do que muitos que assim se autoproclamam.

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