Como comentei ao escrever sobre o recente It: A Coisa, um ótimo indício de que o filme funcionou muito bem é quando temos a clara impressão de que ele será venerado por uma legião de fãs daqui a alguns anos. No caso do sul-coreano A Vilã, porém, essa sensação tornou-se evidente na sequência de abertura: bastou uma cena em que o diretor Jung Byung-gil apresenta todo o seu potencial para ter certeza de que não tardará até que este longa se transforme num cult do Cinema de ação, unindo-se a The Raid: Redemption, Dredd e outras obras nesta jornada.
Roteirizado por Byung-gil ao lado de Jugn Byeong-sik, A Vilã conta a história de Sook-hee, uma mulher que passou a vida inteira sendo treinada para se transformar numa assassina das mais letais. Após ingressar numa missão definitiva, a personagem finalmente parece ganhar a oportunidade de partir para uma vida normal, tendo uma filha e se aproximando de um rapaz no decorrer do processo. No entanto, Sook-hee está sempre sendo perseguida pelo passado foi forçada a vivenciar, o que gradualmente leva a mulher a retomar seu estilo de vida sanguinário e brutal a fim de garantir sua própria sobrevivência.
Logo em seus primeiros minutos, A Vilã já demonstra uma vitalidade digna de nota: mostrando uma personagem cruzando vários cenários diferentes enquanto distribui tiros, socos, chutes e facadas numa série de capangas, a cena de ação que abre o filme consegue a incrível proeza de saltar de uma câmera subjetiva (semelhante ao que Ilya Naishuller fez em Hardcore: Missão Extrema) para uma visão em terceira pessoa dentro de um único plano. Depois disso, a direção de Jung Byung-gil volta a exibir uma energia impressionante, adotando uma estratégia visual que envolve uma movimentação de câmera frenética, mas que mesmo assim permite que o espectador compreenda cuidadosamente o que está acontecendo (e o clímax, em especial, é divertidamente insano e traz alguns planos imaginativos, como aquele que sai de um ônibus e segue Sook-hee num plongée). E digo mais: se Byung-gil não atrair a atenção de Hollywood, é porque realmente não há justiça no mundo.
Sempre disposto a surpreender o espectador através de imagens inesperadamente sangrentas ou cenários que se distinguem o tempo todo, A Vilã conta com um estilo estético que sempre é fortalecido pela fotografia de Park Jung-hun (que aposta em cores intensas e lúdicas que tornam a ação ainda mais compreensível) e pela montagem de Sun-mi Heo (que insere flashbacks pontuais e que surgem através de raccords espetaculares). Por outro lado, se o roteiro merece pontos pela forma inspirada com que retrata os vilões (que se esforçam para criar um simulacro palpável para as suas vítimas, com direito a peças teatrais e atividades artesanais), ele também comete o mesmo erro de Atomic Blonde ao investir numa trama tola e batida que, para piorar, ainda se faz de difícil constantemente.
Assim, A Vilã se torna bem mais confuso e extensivo que o ideal, mas sempre que o filme está prestes a perder o ritmo, logo vem uma cena como aquela em que a protagonista pula de um andar para o outro com uma van para nos animar novamente. Beneficiado também pela performance de Kim Ok-bin, cujo desempenho físico é tão eficaz quanto a dimensão dramática que ela confere à personagem central (as lutas que Sook-hee estrela são convincentes assim como os momentos em que chora diante de um acontecimento trágico), este longa é uma grata surpresa para um gênero que certamente precisa de mais novidades.
Obs.: esse texto foi escrito como parte da cobertura do Festival do Rio 2017.