Antes do Amanhecer

Título Original

Before Sunrise

Lançamento

27 de janeiro de 1995

Direção

Richard Linklater

Roteiro

Richard Linklater e Kim Krizan

Elenco

Julie Delpy, Ethan Hawke, Andrea Eckert, Hanno Pöschl, Karl Bruckschwaiger, Tex Rubinowitz, Erni Mangold, Dominik Castell, Haymon Maria Buttinger, Bilge Jeschim e Adam Goldberg

Duração

100 minutos

Gênero

Nacionalidade

EUA

Produção

Anne Walker-McBay

Distribuidor

Warner Bros.

Sinopse

Jesse, um jovem americano, e Celine, uma linda francesa, se conhecem no trem para Paris, e começam uma conversa que os leva a fazer uma escala em Viena e ficar um pouco mais juntos, sem imaginar o que o destino os reserva.

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Antes do Amanhecer | Crítica

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O amor que sinto pela trilogia Antes… é praticamente platônico. Isso ficou flagrante, para mim, agora com a experiência que tive de assistir aos três filmes em sequência numa maratona especial, no Estação: assim que Céline e Jesse surgiram em tela pela primeira vez, meus olhos subitamente se encheram de lágrimas e… eu sinceramente não sei explicar por quê. Claro que isso não aconteceu quando assisti a Antes do Amanhecer pela primeira vez; ali eu ainda não conhecia esses personagens. Nas assistidas posteriores, porém, sinto como se estivesse reencontrando velhos amigos que há muito não via e pelos quais sentia imensa saudade. É um carinho muito grande que sinto por Céline e Jesse; eu entendo por que eles se interessam um pelo outro tão rapidamente. Vai além de encará-los como dois amigos que vivo shippando e torcendo para que deem certo como casal; é quase como se eu mesmo me sentisse sob a pele de Céline enquanto se apaixona por Jesse e, também, sob a pele de Jesse enquanto se apaixona por Céline.

Esse procedimento, do “se apaixonar” (ou seja: desenvolvendo uma paixão do zero por um indivíduo que acabou de conhecer), é algo que, pela lógica, só é plenamente possível em Antes do Amanhecer (nos dois filmes seguintes, Céline e Jesse já se conheciam e já tinham vivido uma paixão de um dia; já não eram mais que meros estranhos). Quem ofereceu o melhor resumo possível para a dinâmica dos três filmes, aliás, foi o próprio Ethan Hawke: “O primeiro filme é sobre o que poderia ser. O segundo é sobre o que deveria ter sido. O terceiro é sobre o que é.”. Cada capítulo da trilogia funciona por seu respectivo mérito; por acompanhar um período específico/diferente da vida daquele casal, que, portanto, não seria possível de se abordar no exemplar que veio antes e/ou no que vem depois. No caso específico de Antes do Amanhecer, o fator que o move – e que o torna tão apaixonante, para mim – é um certo romantismo meio inocente que é fruto, na essência, de Céline e Jesse aqui serem sujeitos tão jovens. Eles têm seus 20 e poucos anos, não têm sua visão distorcida pelo cinismo comum de quem já passou por muitas desilusões e traições ao longo da vida e, assim, estão experimentando o processo de encontrar o amor de suas vidas sem saber o dia de amanhã.

E a parte do “sem saber o dia de amanhã” é fundamental em Antes do Amanhecer, já que o arco que aqui ocorre é a concretização da coisa mais idealista que se poderia imaginar para um romance entre dois jovens que acabaram de se encontrar: viver um romance de uma vida inteira em apenas um dia. Céline e Jesse se conhecem num trem, resolvem parar em Viena de bobeira, para passar um dia e uma noite perambulando pela cidade enquanto conversam, e na manhã seguinte têm de voltar à rodoviária para seguirem seus respectivos rumos. Eles podem nunca mais voltar a se ver, mas viveram aquela data com a certeza de que foram feitos um para o outro. Se isso não é um romance hiper idealizado, eu sinceramente não sei o que mais seria. À medida que a trilogia vai avançando, ela vai perdendo esse caráter idealista e passa a ser um romance que cativa por ser corriqueiro, por ser facilmente identificável. No primeiro, contudo, existe esse fator da improbabilidade daquele romance, do deadline que (em teoria) põe um ponto final naquele “romance de uma vida” – e isso confere àquele romance um aspecto especial, excepcional, como se aqueles dois jovens vivessem algo que nunca antes na História alguém viveu.

Em outras palavras: essa escolha, do deadline que em teoria põe um ponto final naquele “romance de uma vida” (e, portanto, o torna tão fora do comum), é o que reflete a visão romântica que um tem sobre o outro. Quando a gente é jovem e se apaixona pelo “amor da nossa vida”, a gente tem a certeza de que aquilo ali é algo de outro mundo; a gente encara aquilo sob uma lente sonhadora. A forma que Richard Linklater encontrou de nos fazer encarar aquele romance, entre Céline e Jesse, como algo realmente de outro mundo é… torná-lo atípico. Isso nos faz encarar aquela relação sob a mesma lente de romantismo juvenil pela qual Céline e Jesse se encaram. E o detalhe que torna aquela dinâmica tão lúdica é o mesmo que a torna, ao mesmo tempo, tão dolorida: eles dois se apaixonam, com a certeza (e a alegria) de terem encontrado a alma gêmea um do outro, e o fazem sabendo que no dia seguinte embarcarão em trens diferentes para – em teoria – nunca mais se verem. Eles vivem uma relação que tem hora para acabar, mas mesmo assim insistem em vivê-la. Enquanto a relação está acontecendo, ao longo daquele dia/tarde/noite, eles negligenciam o dia de amanhã e se concentram no agora. Eles praticamente vivem o agora e se esquecem do amanhã; se esquecem de que no dia seguinte se separarão. Eles não pesam a dor que sentirão em função disso. Por quê? Porque o sentimento que sentem um pelo outro é tão intenso que ofusca a consequência; é tão intenso que não dá para simplesmente vivê-lo enquanto pensa no fim ruim que levará.

Neste sentido, Antes do Amanhecer talvez seja um dos filmes que melhor sabem retratar como um romance se dispersa no tempo e no espaço. A relação deles com os espaços ao redor. Eles estão dispersos no espaço-tempo, numa cidade que não conhecem, nenhum personagem ao redor soa como personagem de fato (eles todos são passagens do dia do casal, um acontecimento a mais) e a passagem de dia-para-tarde-para-noite-para-madrugada acontece sutilmente, porque estamos tão imersos no papo deles dois que nem percebemos o avanço das horas. E, nesse ínterim, a gente conhece os dois menos através do que fazem e mais através do que conversam, das ideias que expõem.

E talvez a coisa mais linda de Antes do Amanhecer seja justamente o fato de ser um filme (quase) sem conflito. Não precisa de uma reviravolta, não precisa enfiar à força um terceiro personagem que crie um triângulo amoroso, não precisa de um fator externo que jogue Céline contra Jesse (ou vice-versa) só para, mais tarde, eles voltarem a se aproximar. O que torna esse filme tão especial são esses pequenos momentos de humanidade: Jesse tentando tocar o cabelo da Céline (num gesto que volta depois); Céline exclamando um “merde!” para si ao perder num pinball; Jesse fazendo perguntas sobre a vida; o universo e tudo mais; Céline e Jesse em silêncio ouvindo música numa cabinezinha; Céline e Jesse brincando de se telefonarem; etc.

Em outras palavras: basta vê-los zanzando por Viena durante 100 minutos e batendo papo sobre tudo, nada e um pouquinho mais.

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