A Grande Aposta (1)

Título Original

The Big Short

Lançamento

14 de janeiro de 2016

Direção

Adam McKay

Roteiro

Adam McKay e Charles Randolph

Elenco

Christian Bale, Steve Carell, Ryan Gosling, Brad Pitt, John Magaro, Finn Wittrock, Marisa Tomei e Melissa Leo

Duração

130 minutos

Gênero

Nacionalidade

EUA

Produção

Brad Pitt, Dede Gardner, Jeremy Kleiner e Arnon Milchan

Distribuidor

Paramount Pictures

Sinopse

Michael Burry (Christian Bale) é o dono de uma empresa de médio porte, que decide investir muito dinheiro do fundo que coordena ao apostar que o sistema imobiliário nos Estados Unidos irá quebrar em breve. Tal decisão gera complicações junto aos investidores, já que nunca antes alguém havia apostado contra o sistema e levado vantagem. Ao saber destes investimentos, o corretor Jared Vennett (Ryan Gosling) percebe a oportunidade e passa a oferecê-la a seus clientes. Um deles é Mark Baum (Steve Carell), o dono de uma corretora que enfrenta problemas pessoais desde que seu irmão se suicidou. Paralelamente, dois iniciantes na Bolsa de Valores percebem que podem ganhar muito dinheiro ao apostar na crise imobiliária e, para tanto, pedem ajuda a um guru de Wall Street, Ben Rickert (Brad Pitt), que vive recluso.

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A Grande Aposta | Crítica

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Negar a importância do tema “economia” (ainda mais em tempos de crise) é uma atitude pouco razoável, já que, querendo ou não, a conjuntura da sociedade na qual vivemos nos direciona (a contragosto) para ser afetados diretamente pelo dinheiro e por quem o gerencia. Por outro lado, não é difícil concordar que obras envolvendo o mundo das finanças, especulações e ações têm altas probabilidades de resultarem em experiências desinteressantes, já que o roteiro certamente terá de empregar diálogos altamente técnicos e que podem facilmente confundir a cabeça do espectador. E é justamente este o grande trunfo do diretor Adam McKay (cuja carreira é composta por comédias como Ricky BobbyO Âncora e sua continuação, Tudo por um Furo) neste A Grande Aposta: reconhecendo a natureza aborrecida do assunto a ser discutido, o diretor (que também assina o roteiro junto a Charles Randolph) resolve o problema investindo num banho de criatividade estilística e, de quebra, ainda cria uma atmosfera que salta entre a tensão e o bom humor com uma precisão admirável.

Baseado no livro A Jogada do Século, de Michael Lewis, o longa se concentra em personagens envolvidos no mundo da economia e que conseguiram prever a crise imobiliária de 2008, que se iniciou nos Estados Unidos e abalou o resto do mundo por consequência. Assim, os indivíduos apostaram contra o mercado e se beneficiaram com colapso do sistema financeiro do país – e acredito que todos já tenham previsto o resultado disso. Graças à ausência da regulamentação necessária, títulos hipotecários, suas dívidas e outros “itens” especulativos começaram a causar danos quebrando o banco Lehman Brothers (e que recentemente ressurgiu como uma marca de uísque – uau!). E é claro que quem conseguiu prever o que estava por vir conseguiu tirar algum proveito do colapso.

Beneficiado por um roteiro inteligente e ágil, o filme encontra métodos intrigantes de explicar brevemente termos como “CDSs”, “CDOs” e subprimes não apenas ao inserir pontualmente descrições pequenas escritas em algum canto na tela, mas também ao investir em momentos geniais que trazem figuras populares interrompendo a narrativa para ensinar com irreverência o significado de certos termos – temos Selena Gomez, Anthony Bourdain e Margot Robbie (e esta última remete, obviamente, a O Lobo de Wall Street, que também utilizava o bom humor para abordar questões do mercado financeiro). Neste sentido, as narrações múltiplas e a quebra da quarta parede – que traz personagens falando diretamente com o público – também desempenham um papel funcional ao apresentarem de maneira objetiva os indivíduos envolvidos na trama e o cenário em que estes se encontram.

Aliás, esta adorável inquietação de A Grande Aposta com relação à linguagem se aplica também à excepcional direção de Adam McKay (que já se estabelece como a minha segunda preferência ao Oscar de melhor direção, atrás somente de George Miller): compondo um trabalho estético invejável junto à fotografia de Barry Ackroyd, o cineasta e o diretor de fotografia ganham pontos por investirem na câmera na mão, em planos agitados, em zooms enérgicos para frente ou pra trás emular e em focos que demoram a se ajustar, emulando constantemente um estilo de filmagem recorrente em documentários e conferindo um ar de realismo ao que se vê em tela. Como se não bastasse, há ainda o desempenho de Hank Corwin à frente da montagem, que é fabulosa ao entrecortar o fluxo da narrativa com variadas imagens aleatórias extraídas da TV ou de outras fontes (retratando brevemente a realidade norte-americana do momento), aplicar flashforwards e conceber sequências paralelas de modo a enriquecer a percepção que temos acerca dos personagens, criando ainda rimas entre algumas situações que merecem elogios; e não restam dúvidas de que o Oscar nesta categoria merece ser destinado a Corwin.

Contudo, a competência de McKay também se encontra na própria maneira com que o diretor conduz a narrativa: conseguindo alternar com uma segurança impressionante entre a sobriedade e alívios cômicos que beiram o absurdo em determinadas ocasiões, o diretor consegue criar um clima de tensão crescente e palpável no terceiro ato da película independente da complexidade técnica que domina a maior parte dos diálogos do roteiro, despertando o interesse e a apreensão no espectador mesmo que este não compreenda a fundo o mundo da economia. Da mesma forma, o filme é particularmente inteligente e honesto ao escapar de armadilhas maniqueístas e lembrar o público do quão terríveis foram as consequências do colapso econômico, evitando enaltecer das ações de seus personagens e tratá-los como heróis que se deram bem por terem previsto o que ocorreria em 2008 – para se ter ideia, em dado momento da projeção, o personagem vivido por Brad Pitt interrompe a comemoração de dois indivíduos que enriqueceram com a crise e enfatiza a quantidade de pessoas que perderão seus empregos e casas (vítimas inevitáveis neste tipo de situação).

Contando com um elenco que abrange nomes naturalmente irresistíveis, a produção traz Ryan Gosling visivelmente à vontade como um narrador/executivo que claramente compreende as imperfeições do sistema financeiro sem que sinta a obrigação de demonstrar tal consciência – e sua polidez é o faz com que o personagem ganhe o público logo de cara. No entanto, ainda que Brad Pitt (que também assina como produtor) tenha uma participação modesta – o que não tira o fato de que sempre é um prazer ver o ator em cena -, os dois pilares da obra são certamente Christian Bale e Steve Carell: o primeiro firma com objetividade a personalidade antissocial e fora do comum que caracterizam o personagem (e o fato do ator surgir sozinho com frequência ilustra isso de modo efetivo), sem contar que o fato de emitir sons aleatoriamente, sorrir quando não deveria e raramente encarar as pessoas com quem fala denota um preciosismo fascinante por parte de Bale com relação aos detalhes que imprime em sua interpretação; enquanto Carell (que já demonstrou um potencial admirável em produções dramáticas, como foi mostrado por Foxcatcher) surge na pele de um homem cuja raiva e amargura são correspondidas de maneira ideal pelo ator.

Ainda que o andamento da narrativa às vezes seja frenético demais e o linguajar excessivamente técnico utilizado pelos personagens várias vezes deixe o espectador perdido (neste sentido, vale apontar que não se trata de uma produção que agradará facilmente a todos os públicos), A Grande Aposta poderia formar uma sessão dupla interessante com o eficaz Margin Call. Ao expor a necessidade de se aumentar a regulamentação em cima dos ricaços que investem em Wall Street (e que encabeçam as megacorporações em geral), o longa se consolida como um dos indicados ao Oscar mais tematicamente relevantes do ano. E também como um dos melhores.

Para um filme que discute um assunto chato como economia, A Grande Aposta é surpreendentemente interessante.

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