Sniper Americano (1)

Título Original

American Sniper

Lançamento

19 de fevereiro de 2015

Direção

Clint Eastwood

Roteiro

Jason Hall

Elenco

Bradley Cooper, Sienna Miller, Luke Grimes, Jake McDorman, Cory Hardrict, Kevin Lacz, Navin Negahban, Keir O’Donnell e Sammy Sheik

Duração

132 minutos

Gênero

Nacionalidade

EUA

Produção

Clint Eastwood, Bradley Cooper, Robert Lorenz, Andrew Lazar e Peter Morgan

Distribuidor

Warner Bros.

Sinopse

Adaptado do livro American Sniper: The Autobiography of the Most Lethal Sniper in U.S. Militar History, o filme conta a história real de Chris Kyle (Bradley Cooper), atirador de elite das forças especiais da marinha americana. Durante cerca de dez anos ele matou mais de 150 pessoas, tendo recebido diversas condecorações por sua atuação na Guerra do Iraque.

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Sniper Americano | Crítica

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Concebido a partir de um esmero técnico admirável, Sniper Americano é um filme consideravelmente bem feito que, graças ao talentoso Clint Eastwood e – é claro – ao restante da equipe de produção, encanta por sua fotografia gélida e pessimista, por sua mise-en-scène imaginativa e especialmente por sua mixagem de som absolutamente espetacular cuja clareza confere um realismo tenso capaz de potencializar as emoções sentidas ao longo da projeção, além de trazer sequências de ação enérgicas e funcionais. Infelizmente, todas essas qualidades são usadas a favor de uma obra jingoísta e xenofóbica que serve como um desserviço ético e moral potencializado pela época que vivemos. Ou seja: Sniper Americano não passa de uma “patriotada norte-americana” absolutamente dispensável no ano de 2014 (quando o filme foi lançado).

Escrito por Jason Hallcom base no livro American Sniper: The Autobiography of the Most Lethal Sniper in U.S. Military, o roteiro conta a história real de Chris Kyle, o maior atirador da História dos Estados Unidos dono de um histórico com mais de 160 mortes confirmadas. Nascido e criado no Texas, Kyle atuou na Guerra do Iraque e sobreviveu às suas quatro missões em tal conflito, sofrendo de Estresse Pós-Traumático posteriormente e sendo assassinado em 2 de fevereiro de 2013 junto a um amigo veterano e vizinho quando ambos frequentavam um campo de tiro. Isso que estou resumindo é a realidade, e por mais dispensável que seja, não custa dizer que, enquanto a cinebiografia de Kyle obtém enorme sucesso nas bilheterias, o julgamento de Eddie Ray Routh foi iniciado há poucos dias, ironicamente.

Trazendo uma atmosfera melancólica que enfatiza o estado “espiritual” indesejável de Chris e das situações enfrentadas por este, Sniper Americano é agraciado pelas habilidades artísticas de Clint Eastwood, que é hábil ao conferir à narrativa negativismo e incredulidade reforçadas pela ótima fotografia de Tom Stern, capaz de fazer deste caráter naturalmente desagradável soar ainda mais convincente pelas cores frias e pouco variadas unidas a um tom enevoado que torna o filme sóbrio esteticamente. Da mesma forma, o trabalho sonoro da produção é igualmente eficaz por se mostrar realista ao ponto de soar “imponente” e aplicar ao que se vê em tela algo similar a uma “bravura”, o que transforma a película em algo mais opressor além de verossímil graças à funcionalidade que caracteriza a mixagem e edição de som deste longa. E se o filme denota engenhosidade por empregar batidas pontuais para adicionar tensão às situações enfrentadas pelo protagonista, Eastwood conduz os conflitos entre estadunidenses e iraquianos com segurança e exibe sabedoria por acrescentar múltiplas situações menores ocorrendo no intuito de tornar tais sequências de ação mais complexas e instigantes.

Com qualidades técnicas tão relevantes, é verdadeiramente deplorável constatar o pano de fundo estúpido e antiquado adotado pelo longa. Se o espectador procurar relevar a realidade, é possível que tenha uma experiência recompensadora assistindo a Sniper Americano; o que, infelizmente, não é meu caso. Meu conhecimento sobre História Moderna não é amplo, mas sei aquilo que considero o básico para se viver em sociedade em pleno século 21: em 2003, os Estados Unidos deram início a uma guerra no Iraque que, de acordo com George Bush e Tony Blair, eram movidas pelo intuito de impedir que iraquianos na época governados por Saddam Hussein ameaçassem a segurança externa com armamento de destruição em massa; o que se tornava ainda mais palpável para os estadunidenses considerando a proximidade de tempo para com aos ataques de 11 de setembro. Independente da justificativa, não foram encontradas evidências de armas de destruição em massa ou de relação iraquiana à Al-Qaeda, o que provoca uma reprovação automática quanto à guerra dos estadunidenses no Iraque quando consideramos a numerosidade deste em reservas de petróleo. Bem, não é exatamente isso que Sniper Americano encara como verdade: aqui, os norte-americanos são heróis movidos pela necessidade de impedir a ameaça global dos perversos iraquianos responsáveis pelos atentados de 11 de setembro de 2001, se é que me entendem.

Assim, este filme não é mais que uma propaganda ultrapassada de nacionalismo que atinge níveis detestáveis moralmente. Ora, trata-se de uma obra que abraça a justificativa dada por Bush e Blair para a ocorrência da Guerra do Iraque, o que obviamente faz com que o filme demonstre uma ignorância tremenda ao retratar os iraquianos como terroristas semelhantes aos reais responsáveis pelas tragédias de 11 de setembro de 2001. A mensagem pode até não ser clara, porém ainda assim é facilmente perceptiva; e mesmo quando o longa parece exibir alguns esforços para relatar a insatisfação dos soldados quanto à condição de vida e/ou as consequências desagradáveis de uma guerra, a impressão que temos é de que Clint Eastwood e Jason Hall estão apenas riscando um item de uma lista de afazeres para evitar críticas à sua politização porca e repreensível.

Como se não bastasse, o simples fato de que já estamos em 2015 faz Sniper Americano soar datado e antiquado graças ao cenário fartamente jingoísta e xenofóbico que constrói, visto que este nacionalismo agressivo e ultrapassado já se tornou uma mancha terrivelmente maligna na reputação dos Estados Unidos – e antes de qualquer pergunta: me recuso a resumir um único estadunidense como um ser desprovido de sensatez e dominado pelo patriotismo vazio e maniqueísta, ainda que reconheça a existência polvorosa de indivíduos que seguem este perfil ao ponto de compreender o que levou à má fama do país no restante do mundo. O que me leva a um questionamento: afinal, por qual razão específica Sniper Americano existe de tal forma?

Demonstrando ser imaturo o suficiente para escancarar o maniqueísmo com o qual narra a vida de Chris Kyle, o longa ainda faz questão de relatar a vida do sniper de uma forma heroificada ao ponto de remeter a um filme de super-heróis – com direito, inclusive, a um nêmesis do “herói”. Com isso, Kyle acaba se transformando num personagem excessivamente artificial cujas motivações o tornam ainda menos verossímil em detrimento da politização medíocre que caracteriza a obra, pois a partir do momento em que se entrega a um cenário jingoísta na plena acepção da palavra, Sniper Americano é obrigado a refletir em seu “herói” o patriotismo brutal e o receio para islâmicos unidos à irracionalidade. Esta necessidade é captada pelo público nas numerosas vezes em que Chris diz, com a sutileza de… uma manada de elefantes, que é movido pela obrigação de proteger o país que tanto ama, algo que transforma o sniper num ser bidimensional salvo pela boa interpretação de Bradley Cooper, que aparenta se esforçar ao máximo para conferir alguma dimensão a Chris e torná-lo algo além de uma caricatura. O tratamento que o filme aplica acerca da questão do Estresse Pós-Traumático, por sua vez, é intrigante e promissor, mas também não passa de um afazer riscado numa lista que reúne alguns.

Repleto de diálogos conceitualmente tolos, Sniper Americano é o tipo de obra que simplesmente não precisa ser realizada quando não consideramos sua concepção técnica. Não há como deixar de lamentar a natureza suja e imatura de uma produção dona de atrativos tão admiráveis. É uma lástima que uma competência técnica tão respeitável esteja incluída num longa moralmente desprezível que, se dependesse do Ron Woodroof interpretado brilhantemente por Matthew McConaughey em Clube de Compras Dallas, venceria o Oscar de melhor filme sem questionamentos.

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