Um Limite Entre Nós

Título Original

Fences

Lançamento

2 de março de 2017

Direção

Denzel Washington

Roteiro

August Wilson

Elenco

Denzel Washington, Viola Davis, Stephen Henderson, Jovan Adepo, Russell Hornsby, Mykelti Williamson e Saniyya Sidney

Duração

139 minutos

Gênero

Nacionalidade

EUA

Produção

Denzel Washington, Todd Black e Scott Rudin

Distribuidor

Paramount Pictures

Sinopse

Anos 1950. Troy Maxson (Denzel Washington) tem 53 anos e mora com a esposa, Rose (Viola Davis), e o filho mais novo, Cory (Jovan Adepo). Ele trabalha recolhendo lixo das ruas e batalha na empresa para que consiga migrar para o posto de motorista do caminhão de lixo. Troy sente um profundo rancor por não ter conseguido se tornar jogador profissional de baseball, devido à cor de sua pele, e por causa disto não quer que o filho siga como esportista. Isto faz com que o jovem bata de frente com o pai, já que um recrutador está prestes a ser enviado para observá-lo em jogos de futebol americano.

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Um Limite Entre Nós | Crítica

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Baseado na peça teatral Fences escrita por August Wilson em 1983 e que ganhou o prêmio Pulitzer após quatro anos, Um Limite Entre Nós oferece um estudo de personagem louvável: depois de apresentar o espectador a um sujeito ocasionalmente divertido, este vai se revelando cada vez mais detestável durante o decorrer da projeção. Assim, o projeto busca compreender as facetas que tornam este protagonista tão ambíguo, sendo bem-sucedido em suas tentativas de conceber um indivíduo tão interessante quanto desagradável. Da mesma forma, aqui e ali o longa também fornece algumas situações ou falas específicas que, de modo bastante pontual, apontam para o racismo que era ainda maior na década de 1950, acertando ao relembrar este fato mesmo que o tema central da narrativa não gire em torno disso.

Concebida com base no roteiro que o próprio Wilson escreveu antes de morrer (em 2005), esta adaptação de Um Limite Entre Nós para o Cinema é protagonizada por Troy Maxson, um lixeiro cuja idade já ultrapassa os 50 anos e que sonha em ascender profissionalmente: em vez de se prender à parte traseira do caminhão, o desejo do personagem é assumir o volante do veículo – algo que ele considerava impossível simplesmente por ser negro. Amargurado por jamais ter despontado como jogador de baseball, Troy vive em Pittsburgh sustentando sua esposa Rose (que insiste para que ele termine de construir uma cerca), seu filho menor e seu irmão mentalmente prejudicado. Lamentavelmente, a visão que o protagonista tem a respeito da sociedade é das mais pessimistas: encarando o mundo como um caso perdido, Troy vive expondo sua desesperança e limita severamente seus filhos porque, de acordo com sua lógica, “os negros nunca foram nem serão aceitos” – desta forma, ele opta por compactuar com o racismo latente em vez de tentar combatê-lo.

O primeiro aspecto digno de nota em Um Limite Entre Nós consiste nos diálogos cujas origens teatrais são sempre evidentes: desde as conversas divertidas ocorridas no primeiro ato até as confrontações intensas que marcam presença no terceiro, o texto de August Wilson traz falas complexas que constantemente desafiam não só o elenco, mas o público de modo geral. Mesmo assim, os diálogos nunca soam artificiais ou excessivamente histriônicos, surgindo com uma naturalidade admirável quando o objetivo é abordar a alegria que pontualmente preenche a vida de Troy e Rose ou o drama que passa a ser encarado por volta da metade da projeção. Além disso, o monólogo que o protagonista inicia depois que seu filho pergunta se eles podem comprar uma televisão parece não ter nada a ver com o questionamento inicial, mas não tarda até que Troy logo cria uma relação que justifica sua longa explicação. E se a Morte é tratada com irreverência no início do longa, ela gradualmente passa a ganhar contornos mais sombrios que, mais uma vez, comprovam a eficácia do roteiro de Wilson.

Claro que, para que funcionassem por completo, os ótimos diálogos tinham que ser correspondidos por atuações adequadas; e felizmente, isso é o que não falta em Um Limite Entre Nós. Vivendo Troy como um sujeito que se esforça para compensar o passado torturante através de prazeres pequenos e trocas de favores, Denzel Washington cria um personagem que, a princípio, conquista a simpatia do público graças não apenas ao carisma habitual do ator, mas à afinidade que demonstra pela esposa e pelos amigos. Por outro lado, a partir daí, Troy começa a ser rejeitado pelo espectador à medida que expõe as falhas terríveis em seu caráter: além de não reconhecer que seu fracasso como jogador de baseball se deve à idade, se esquivando do remorso ao pôr a culpa no resto do mundo (que, segundo ele, obriga os jogadores negros a serem duas vezes melhores que os brancos para que possam se destacar), o protagonista trai seus entes queridos e trata os filhos de maneira grotesca, acreditando que o fato dele pagar as contas e sustentar a família já é o suficiente para eximi-lo de grandes responsabilidades. Por sua vez, Viola Davis encarna Rose como uma mulher capaz de se divertir e rir na companhia do marido, mas que parece aceitar suas imperfeições sem deixar de nutrir ressalvas evidentes – e a forma como ela reage às revelações que vêm no fim do segundo ato faz com que Davis mereça definitivamente o Oscar pelo qual foi indicada.

Quanto ao seu desempenho como diretor, porém, Denzel Washington nunca faz questão de chamar a atenção para si mesmo e realiza um trabalho satisfatório, mas pouco expressivo e visualmente simplista – o que não quer dizer, no entanto, que Washington não seja capaz de criar momentos verdadeiramente emocionantes (como a passagem do segundo para o terceiro ato) ou de ilustrar de maneira apropriada a relação carinhosa que Troy divide com seus entes queridos. Infelizmente, o terço final de Um Limite Entre Nós é marcado por algumas decisões bregas tomadas pela direção, com direito a uma câmera subjetiva de algo imaterial – e se a última cena, em especial, mostra-se tremendamente cafona ao envolver uma forte luz vinda do céu (quero evitar spoilers e, portanto, não detalharei mais que isso), o fato do filme inteiro permanecer na casa da família Maxson não só indica uma incapacidade da obra se distanciar de suas origens teatrais, como ainda limita o design de produção elaborado por David Gropman, que sim, é hábil ao recriar a estética suburbana dos anos 1950, mas sofre ao se prender num único local na maior parte do tempo.

Apesar destes pecados ocasionais, a obra é fortalecida principalmente pelo elenco composto por nomes dignos de nota e pelos diálogos irresistíveis que estabelecem uma dinâmica dolorosa, mas densa e impactante entre os personagens. Se Um Limite Entre Nós funcionava bem no Teatro, não sei dizer; mas seu resultado no Cinema é, sim, bem-sucedido.

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