Até o Último Homem

Título Original

Hacksaw Ridge

Lançamento

26 de fevereiro de 2017

Direção

Mel Gibson

Roteiro

Andrew Knight e Robert Schenkkan

Elenco

Andrew Garfield, Hugo Weaving, Teresa Palmer, Vince Vaughn, Sam Worthington, Luke Bracey, Ryan Corr, Rachel Griffiths, Richard Roburgh, Luke Pegler, Richard Pyros, Nathaniel Buzolic, Ben Mingay, Firass Dirani, Matt Nable e Robert Morgan

Duração

139 minutos

Gênero

Nacionalidade

EUA

Produção

Terry Benedict, Paul Currie, Bruce Davey, William D. Johnson, Bill Mechanic, Brian Oliver e David Permut

Distribuidor

Diamond Films

Sinopse

Durante a Segunda Guerra Mundial, o médico do exército Desmond T. Doss (Andrew Garfield) se recusa a pegar em uma arma e matar pessoas, porém, durante a Batalha de Okinawa ele trabalha na ala médica e salva mais de 75 homens, sendo condecorado. O que faz de Doss o primeiro Opositor Consciente da história norte-americana a receber a Medalha de Honra do Congresso.

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Até o Último Homem | Crítica

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Mel Gibson está de volta. Mais de 20 depois de ter comandado Coração Valente, um clássico insubstituível que até hoje é lembrado por todos os apreciadores de Cinema, o ator/diretor foi afastado das telonas após se envolver em polêmicas particulares, reconstruiu aos poucos seu retorno através de papeis em novos projetos e, agora, parece ter ressurgido de vez realizando Até o Último Homem – e, ao conferir o longa dirigido por Gibson, há uma sensação que fica clara: seu talento como cineasta é grande demais para ser ofuscado por escândalos e erros pessoais.

Roteirizado por Andrew Knight e Robert Schenkkan, o filme é baseado na história real de Desmond Doss, um católico devoto que, ao perceber que o mundo havia acabado de entrar na Segunda Guerra Mundial, logo se alista no Exército com o objetivo de apoiar as tropas presentes no campo de batalha – contrariando, com isso, a vontade de seu pai Tom, que lutou na Primeira Guerra e carrega traumas insuperáveis. No entanto, existe um detalhe que passa a representar um obstáculo na jornada de Desmond: ainda que queira se transformar num soldado, o jovem se recusa a tocar em qualquer tipo de arma; o que, numa guerra, é quase impossível. Sendo assim, o longa passa a acompanhar os esforços de Doss para conquistar seus objetivos e como estes são postos à prova no meio da Cordilheira Hacksaw, onde o protagonista e seus parceiros confrontarão as tropas japonesas.

Eficiente ao construir com cuidado a personalidade de Desmond, o roteiro de Até o Último Homem é inteligente principalmente no que diz respeito à sua estrutura narrativa: evitando antecipar detalhes que deveriam ser reservados para um ponto mais avançado da trama, o primeiro ato se foca em estabelecer cautelosamente as motivações para que o personagem principal rejeite a violência com tanta convicção, revelando que o descontrole de suas ações pode induzir a atos de extrema brutalidade. Depois desta apresentação meticulosa, o público torna-se capaz de compreender a interação hostil e complicada entre Dosse o Exército antes que a segunda metade da projeção venha à tona, quando a guerra é ilustrada e as atitudes do protagonista soam plausíveis graças – novamente – a tudo que foi mostrado anteriormente. Da mesma forma, o roteiro é hábil na criação do foreshadowing (um elemento introduzido no início que ganhará uma importância inesperada mais à frente) e ao incluir pequenos detalhes que servem sutilmente para complementar a mentalidade de Doss (em certo instante, um tijolo é usado como arma; depois, o mesmo item volta a ser utilizado pelo herói como instrumento para salvar uma pessoa).

De todo modo, o que realmente impressiona são as sequências ambientadas na Cordilheira Hacksaw, quando Mel Gibson enfim se envolve com o que é sua especialidade: se A Paixão de Cristo abusava da violência a ponto de anestesiar o impacto que deveria haver no clímax da história (a crucificação de Jesus), Até o Último Homem acerta em guardar seus momentos mais acachapantes para quando estes forem verdadeiramente necessários. Com isso, quando a agressividade passa a marcar presença, ela soa chocante justamente por não ter sido antevista demais – diga-se de passagem, Gibson exibe um esmero notável ao explorar a truculência de modo a torná-la reveladora e imprevisível: quando Desmond arrasta um soldado gravemente ferido, logo o plano se abre mais e constatamos que o indivíduo perdeu as pernas; quando alguém aparentemente morto se levanta aos berros, seu rosto é esburacado por tiros imediatos; quando uma granada explode debaixo de alguém correndo, a perna do sujeito voa em direção à câmera. E se a ótima mixagem de som faz um trabalho admirável imergindo o espectador no meio do campo de batalha (notem os barulhos agudos que as balas fazem quando atingem os capacetes dos combatentes), Gibson concebe uma lógica espacial digna de nota ao empregar planos plongée que mostram detalhadamente o estrago feito por uma granada e planos gerais que transformam os soldados em criaturas minúsculas diante de explosões grandiosas, sem contar o trecho geograficamente bem elaborado onde vemos o fogo cruzado entre um japonês e o capitão norte-americano, que, por sua vez, necessita que Desmondse aproxime sem ser fuzilado.

Por outro lado, nunca é um bom sinal quando um filme parece estar prestes a se encerrar, mas este desfecho é postergado em mais cenas numerosas – e isso ocorre três ou quatro vezes em Até o Último Homem. Contudo, esta não é a única falha presente no roteiro de Andrew Knight e Robert Schenkkan: imperfeito a ponto de incluir cenas teoricamente “inspiradoras” e “poéticas” que só aparentam existir mesmo num mundo fantasioso, o longa é repleto de diálogos cuja artificialidade chega a ser dolorosa, algo que, aliado aos excessos ocasionais cometidos pela direção de Gibson (falo mais sobre isso adiante), contribuem para que a experiência torne-se menos convincente e mais brega que o necessário. Em certo momento, o capitão interpretado por Sam Worthington declara que “Se ele vier com Deus para cima de mim, jogarei o Inferno para cima dele“; mais à frente, um personagem ao protagonista diz que “Esta arma não vai morder“, no que é respondido com “Vai sim, olhe à sua volta“; alguns minutos depois, quando o mesmo soldado afirma que Desmond não matou seu pai, o herói fala “No meu coração, eu o matei“.

Mas essas cafonices não tangem apenas ao roteiro, já que o próprio Mel Gibson exagera ao trazer determinadas ações que parecem funcionar apenas em blockbusters hollywoodianos e encerrar o filme com um plano tremendamente tolo que associa o conceito de luz à religiosidade do personagem principal. Na verdade, Até o Último Homem começa a brilhar de fato a partir da metade da projeção, pois até lá somos forçados a encarar diversas situações clichês que são realçadas por técnicas óbvias, como aqueles zooms que se aproximam lentamente de alguém quando este anuncia algo revelador, importante ou cativante. A mesma fragilidade se encontra no romance entre Doss e a enfermeira vivida por Teresa Palmer (simpaticíssima, por sinal), que mostra-se apressado e esquemático demais para conquistar a simpatia do público. Para piorar, a trilha sonora de Rupert Gregson-Williams faz questão de ressaltar todas as emoções que a obra pretende despertar no espectador, revelando-se excessiva na concepção do drama.

Em compensação, se Hugo Weavingrealiza um desempenho admirável ao transformar Tom Doss em um sujeito ao mesmo tempo violento e traumatizado (só a cena em que ele chora explicando o porquê da guerra ser tão prejudicial já faria valer indicações a prêmios), Andrew Garfield demonstra que vem evoluindo como ator e compõe Desmond como uma pessoa heroicamente dócil, como se carregasse algum tipo de inocência pueril dentro de si e externalizasse o sentimento através de expressões que refletem seu choque diante da realidade brutal à sua volta.

O fato é que, ainda que traga problemas pontuais e difíceis de negar, Até o Último Homem se estabelece como um destaque entre os “filmes de guerra” atuais, algo que claramente provém da eficácia inquestionável de seu realizador – e tomara que Mel Gibson não demore a retornar à cadeira de diretor, pois talento não lhe falta.

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