Bom Comportamento

Título Original

Good Time

Lançamento

19 de outubro de 2017

Direção

Benny Safdie e Josh Safdie

Roteiro

Josh Safdie e Ronald Bronstein

Elenco

Robert Pattinson, Benny Safdie, Jennifer Jason Leigh, Taliah Webster, Buddy Duress, Peter Verby, Necro e Barkhad Abdi

Duração

99 minutos

Gênero

Nacionalidade

EUA

Produção

Sebastian Bear-McClard, Oscar Boyson, Terry Dougas e Paris Kasidokostas Latsis

Distribuidor

Paris Filmes

Sinopse

O plano de Constantine Nikas (Robert Pattinson) era assaltar um banco e descolar uma boa quantia em dinheiro, mas nada sai como o planejado e seu irmão mais novo acaba sendo preso. Decidido a resgatá-lo, Constantine embarca em uma perigosa corrida contra o relógio, e onde ele mesmo é o próximo alvo da polícia.

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Bom Comportamento | Crítica

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Não é de hoje que falo sobre como o Cinema hollywoodiano dos anos 1970 refletiu a amargura de sua época (basta reler o que escrevi sobre o primeiro Star Wars para entender que, a meu ver, George Lucas foi um dos que “quebraram o gelo” através de escapismo e otimismo). Foram muitos os motivos motivos que mergulharam os Estados Unidos num clima de desilusão geral, o que fez com que obras como Laranja MecânicaApocalypse Now e Taxi Driver se transformassem em representações precisas daqueles tempos. Assim, quando Bom Comportamento começa e seu título surge embalado numa estética setentista, com neons e sintetizadores, as intenções dos irmãos Benny e Josh Safdie torna-se perfeitamente plausível: embora lançado e ambientado num contexto recente, este é um filme que poderia facilmente ter chegado aos cinemas na década de 1970.

Escrito por Josh Safdie ao lado de Ronald Bronstein, o roteiro nos apresenta a Connie Nikas, um sujeito que leva seu irmão Nick (portador de uma deficiência mental) para assaltar um banco. Depois que a ação dá terrivelmente errado, Connie consegue escapar enquanto Nick é preso e levado para sofrer nas mãos dos outros detentos; que não tardam a espancar o coitado e mandá-lo para um hospital. Com isso, Connie começa a buscar meios de tirar seu irmão da cadeia – e o que seria mais adequado: 1) juntar dinheiro para pagar a fiança; ou 2) pôr um plano de fuga em prática? Ao tentar fazer as duas coisas, porém, o criminoso só piora a situação cada vez mais, colocando várias vidas em risco (incluindo a dele mesmo).

Situado numa atmosfera naturalmente incômoda, fria e pessimista, Bom Comportamento pode ser resumido num jargão bastante popular: o crime não compensa – e se Connie Nikas passa a destruir vidas, é porque sucumbiu completamente após se assumir como um assaltante. Desta forma, é doloroso constatar como todos os personagens que aparecem no decorrer da narrativa tornam-se possíveis vítimas de Connie: Nick, por exemplo, não seria preso e agredido na cadeia se não estivesse agindo como cúmplice de seu irmão. Além disso, existem pessoas inocentes que são presas ou espancadas apenas para que o protagonista consiga alcançar um objetivo (que, por sua vez, é fruto de origens criminosas), sendo imediatamente prejudicadas somente por estarem no caminho de Connie. Assim, Bom Comportamento se transforma numa experiência desagradável, pois não é fácil ver uma série de indivíduos serem destroçados a troco de nada graças a um cidadão que abraçou o crime.

Cidadão este que, por sinal, também é vítima de suas próprias atitudes, tanto que a sequência incessante de fracassos e tragédias que vão acontecendo com o sujeito nada mais são do que uma consequência das escolhas que ele fez no início. Ao levar uma vida criminosa sem nenhuma perspectiva de salvação, Connie não apenas arruína os que estão à sua volta como também é gradualmente conduzido a um precipício particular. É por isso, inclusive, que o fato do filme não se encerrar de maneira otimista é tão importante, já que qualquer tentativa de criar um final feliz automaticamente diminuiria a força e o impacto da mensagem que a obra pretende transmitir. Aqui cabe uma pergunta: se Bom Comportamento desenvolve a questão do “crime não compensa” de modo tão enfático e pessimista, é absurdo supor que o longa esteja sendo simplesmente realista ao encarar o ser humano como uma criatura má e condenada?

O que nos traz a Robert Pattinson, que, aqui, me convenceu de que a melhor coisa que a série Crepúsculo fez foi dar visibilidade a ele e à colega Kristen Stewart. Concebido como uma persona propensa à degradação desde o princípio, Connie Nikas é uma pessoa repleta de energia e vitalidade, sendo trágico que ele jogue ambas no lixo ao se envolver com o crime – e a maneira como Pattinson confere vida e agilidade ao personagem vai na contramão daquele poço de apatia que era Edward Cullen. O mais admirável, no entanto, é constatar como Pattinson desenvolve as nuances do protagonista: se no início Connie ainda era um cidadão capaz de gerar empatia, aos poucos ele vai se convertendo num monstro que pode facilmente ser descrito como o vilão da história (o que é curioso, já que seu apego pelo irmão sempre soa genuíno). Para completar, o diretor Benny Safdie também dá vida a Nick Nikas e o transforma naquele que talvez seja a figura mais trágica da obra, conquistando a compaixão do público ao passo que Jennifer Jason Leigh se sai bem ao criar (em pouco tempo) uma personagem que parece se interessar por uma vida mais insana mesmo sendo sustentada por uma mãe controladora. (Já Barkhad Abdi é tristemente reduzido a uma participação rápida e ingrata, como também ocorreu em Blade Runner 2049.)

Fortalecido pela fotografia estilosa e intensa de Sean Pricce Williams, que investe pesadamente em cores saturadas e que se contrastam de forma imaginativa (há um plano onde os passageiros de um ônibus são banhados em vermelho enquanto o que está fora do veículo é dominado por azul), Bom Comportamento finalmente merece pontos pela linguagem frenética e surtada que os irmãos Safdie propõem, como se os aspectos técnicos da produção acompanhassem o ritmo pulsante do universo onde Connie Nikas habita: apostando frequentemente numa movimentação de câmera inquieta e fechada nos rostos dos atores, a direção revela uma energia também presente na montagem, que, elaborada por Ronald Bronstein e pelo próprio Benny Safdie (sim, dois profissionais), transforma o andamento da trama em algo quase alucinante. O mesmo pode ser dito sobre a trilha sonora de Daniel Lopatin, que desenvolve uma tensão crescente e ininterrupta a partir de sintetizadores e batidas frequentes.

Mesmo que o ritmo seja enfraquecido na metade final do segundo ato, quando os personagens vão a um parque de diversões fechado e o segmento em questão se torna um pouco mais lento que o necessário, Bom Comportamento é uma obra certamente incômoda e que talvez desagrade à maior parte do público médio (isso porque não citei as imagens pesadas como a que mostra um deficiente sendo agredido ou aquela que traz um adulto transando com uma menina). Por outro lado, a verdade é que trata-se de um filme admirável do ponto de vista estilístico e relevante nas discussões temáticas que deseja promover.

Já ouvi dizer que o bom Cinema tem o mérito de sempre refletir a época em que está sendo produzido. Pois se Bom Comportamento tem tudo a ver tanto com a década de 1970 quanto com o ano de 2017, isso é um sinal de que melhoramos pouco (ou nada) de lá para cá.

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