O Homem do Norte (1)

Título Original

The Northman

Lançamento

12 de maio de 2022

Direção

Robert Eggers

Roteiro

Robert Eggers e Sjón

Elenco

Alexander Skarsgård, Ethan Hawke, Anya Taylor-Joy, Nicole Kidman, Claes Bang, Willem Dafoe e Björk

Duração

137 minutos

Gênero

Nacionalidade

EUA

Produção

Robert Eggers, Alexander Skarsgård, Mark Huffam, Lars Knudsen e Arnon Milchan

Distribuidor

Universal Pictures

Sinopse

O príncipe Amleth está prestes a se tornar um homem quando seu tio assassina seu pai e sequestra sua mãe. Duas décadas depois, o jovem é agora um viking com a missão de salvar a mãe, matar o tio e vingar o pai.

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O Homem do Norte | Crítica

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(Há um parágrafo no meio do texto que contém um spoiler de O Homem do Norte. Quando chegar a hora, eu avisarei de forma enfática para que quem ainda não assistiu ao filme possa pular para o parágrafo seguinte.)

O Homem do Norte é um exercício de estilo que beira o absoluto vazio. Ao longo de 137 minutos de projeção, o diretor Robert Eggers (A Bruxa e O Farol) nos apresenta a uma série de imagens plasticamente belíssimas, mas que constantemente carecem de qualquer substância que as motive – a ponto de que, confesso, tenho dificuldades em entender por que Eggers quis realizar este filme. O objetivo era recontar uma história que ele julgava pertinente apresentar a novos públicos? Era pôr em tela imagens que ele tinha em mente e desde sempre desejava concretizar para que o resto do mundo também as visse? Ou era simplesmente… a obrigação de ter que realizar um novo filme a fim de manter o nome do diretor em voga (mesmo que a motivação artística em si não existisse)? Independente da resposta, o fato é que a junção de decisões estilísticas (que, aqui, soam quase como muletas) de Robert Eggers alcançou, em O Homem do Norte, um resultado que no mínimo foi eficiente em preservar meu interesse pelo que acontecia em tela e meu impacto diante de suas composições.

O que também não muda o fato de que boa parte destes efeitos – que o filme surtiu em mim – foram instantâneos, desaparecendo imediatamente após o término da sessão. Neste sentido, é revelador que em vários momentos O Homem do Norte tenha me feito lembrar de O Regresso: obras que partem de premissas relativamente simples (e simplórias) e que tentam desesperadamente nos convencer de sua “grandiosidade” através de imagens que dizem mais sobre os fetiches avulsos de seus diretores do que sobre qualquer outra coisa.

Escrito por Eggers e pelo poeta islandês Sjón (a partir, é claro, da lenda saxã do guerreiro que dá título ao filme), o roteiro tem início em 895 a.C. e se divide em cinco capítulos que acompanham toda a vida do príncipe Amleth (Skarsgård), que, filho do rei Aurvandill (Hawke) e da rainha Gudrún (Kidman), é preparado desde pequeno para assumir o trono do vilarejo de Hrafnsey assim que seu pai se ausentar. Tudo muda, porém, quando o tio Fjölnir (Bang) coordena uma revolta contra o reino do irmão que termina na execução deste – e de vários cidadãos indefesos de Hrafnsey –, levando Amleth a fugir do caos e da matança que tomou conta de sua terra a fim de passar os próximos anos de sua vida treinando para retornar e vingar o pai, salvar a mãe e matar o tio. Quando reencontramos Amleth, mais de dez anos depois, o garoto de outrora agora se transformou num imponente e selvagem viking capaz de cometer as maiores brutalidades (contra pessoas indefesas de outros vilarejos, inclusive) em prol de sua vingança, aproximando-se da escrava Olga (Taylor-Joy) no processo.

O primeiro aspecto que chama a atenção em O Homem do Norte é o interesse de Robert Eggers em mergulha o espectador na lógica com a qual o próprio Amleth encara o mundo e a realidade ao seu redor, imprimindo na tela (até certo ponto, como discutirei adiante) a mentalidade truculenta que define as ações do protagonista – e, neste sentido, é interessante perceber como a violência presente no filme é extrema do ponto de vista gráfico, mas ao mesmo tempo absolutamente casual na maneira com que é executada: os personagens decepam braços, cabeças e narizes de seus oponentes com a naturalidade de quem já está totalmente acostumado a praticar tais barbaridades, como se o choque por estar cometendo um ato brutal há muito tivesse se perdido porque, afinal, a brutalidade em si virou modus operandi. Além disso, o longa toma a curiosa decisão de absorver a visão de mundo do protagonista a ponto de desapegar-se completamente de conceitos materiais, abraçando o metafísico e assumindo as crenças de Amleth como se fossem as do filme – e, com isso, Eggers não teme pausar pontualmente a narrativa para incluir aparições de valquírias e profetas nórdicas (uma delas interpretada pela cantora Björk, aliás) sem sentir-se obrigado a explicar didaticamente quem/o que são elas, já que estes elementos simplesmente fazem parte da forma com que o (anti-)herói enxerga a realidade que o cerca.

Que o clímax da jornada de Amleth ocorra – spoiler à frente! – num plano espiritual em vez de físico é um detalhe fantástico que, além de permitir que Eggers crie um desfecho visualmente espetacular, serve também para confirmar que as crenças nórdicas do protagonista (em especial, nos portões de Valhalla) são partilhadas pelo filme que o abriga. Não importa se há mesmo vida após a morte; o que importa é que Amleth acredita nela a ponto de poder resolver (espiritualmente?) suas pendências com o tio após ambos estarem fisicamente mortos – e, assim, Eggers faz jus às crenças e à mentalidade do protagonista de seu longa.

Pelo menos, até certo ponto.

E se digo isso é porque, para cada momento que consegue fazer jus à forma com que Amleth vive e enxerga a própria realidade, há diversas outras que sugerem que Robert Eggers talvez esteja começando a ser acometido por uma preocupante “síndrome de Iñárritu” após o sucesso de seus dois projetos anteriores. Assim, em vários momentos do longa, Eggers e o diretor de fotografia Jarin Blaschke parecem interessados não apenas em criar uma lógica visual eficiente, mas, principalmente, em mostrar para o espectador que há um cineasta por trás da câmera, o que eventualmente quebra a imersão do público naquele universo diegético – e, por mais que eu admire o feito técnico que Eggers e Blaschke alcançam (a maneira com que a câmera desliza suavemente de um canto a outro, registrando ações inteiras através de um único plano, sem cortes), por outro não consigo deixar de notar que esta abordagem soa calculada, rígida e até contraproducente, já que nos distancia do protagonista (e traindo justamente o que elogiei nos parágrafos anteriores) ao nos fazer prestar mais atenção nos movimentos que a câmera executa do que na ação que ela está registrando.

De certa maneira, o mesmo se aplica à narrativa em si, que, no roteiro de Eggers e Sjón, o tempo todo se sente forçada a interromper a selvageria dos indivíduos bárbaros que acompanha a fim de enfiar desajeitadamente uma dinâmica shakespeareana nas relações entre os personagens e nos diálogos recitados por estes – uma dinâmica que, de novo, soa pomposa e reverente demais para entrar em sintonia com o imaginário bruto, imundo e sanguinolento do protagonista. (Nem preciso dizer que a mise-en-scène imaginada por Eggers para estes momentos faz questão de tentar evocar a aura soberba e suntuosa almejada pelos diálogos, o que nos traz de volta ao problema da rigidez estilística que apontei no parágrafo anterior.)

Evitando fazer quaisquer julgamentos a respeito da (i)moralidade de seu protagonista, O Homem do Norte é centrado em um indivíduo que frequentemente surge cometendo atos de extrema brutalidade e, principalmente, executando vidas inocentes (incluindo de crianças) que nada tinham a ver com a guerra que travava, deixando a tarefa de condenar as ações do personagem para o espectador. Dito isso, Alexander Skarsgård surge impressionante do ponto de vista físico, mas nunca a ponto de tornar-se charmoso ou galanteador, o que é importante para que jamais deixemos de enxergar Amleth como uma figura minimamente atraente – e tudo na performance (e na presença) de Skarsgård corrobora para confirmar a truculência e a selvageria do protagonista, o que é apropriado. Já o restante do elenco (repleto de nomes talentosos) pouco tem a fazer em cena, ficando preso a personagens geralmente unidimensionais.

Com isso, O Homem do Norte representa uma experiência peculiar: ao mesmo tempo em que é interessante o suficiente para manter o espectador preso à narrativa que se desenrola, é também emocionalmente nulo e incapaz de disfarçar o fato de que se trata de um capricho tão bonito quanto fútil.

***

(Lembre-se: a pandemia não acabou. Se for sair de casa e ir ao cinema, siga todos os cuidados sugeridos pelas organizações sérias de Saúde e, mais importante, vá ao posto tomar sua vacina. Se já tomou a primeira dose, tome a segunda. Se já tomou a segunda e já chegou a vez de tomar a terceira, tome a terceira – se ainda não chegou, espere e vá assim que ela estiver disponível. É triste ter que escrever isto, mas… não escute o atual presidente da República ou mesmo seu ministro da Saúde: vacine-se e proteja-se. #ForaBolsonaro)

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