Os Banshees de Inisherin (1)

Título Original

The Banshees of Inisherin

Lançamento

2 de fevereiro de 2023

Direção

Martin McDonagh

Roteiro

Martin McDonagh

Elenco

Colin Farrell, Brendan Gleeson, Kerry Condon, Barry Keoghan, Gary Lydon, Jon Kenny, Sheila Flitton, Bríd Ní Neachtain, Aaron Monaghan e David Pearse

Duração

114 minutos

Gênero

Nacionalidade

Irlanda/Inglaterra

Produção

Martin McDonagh, Graham Broadbent e Pete Czernin

Distribuidor

Disney

Sinopse

Em uma ilha remota na costa oeste da Irlanda, Pádraic e Colm são melhores amigos de longa data. Certo dia, Colm decide por fim na amizade repentinamente e a decisão gera consequências alarmantes para ambos.

Publicidade

Os Banshees de Inisherin | Crítica

Facebook
Twitter
Pinterest
WhatsApp
Telegram

Os Banshees de Inisherin é um filme que conquista pela simplicidade não só da escala de sua trama, mas dos temas que discute. Se o trabalho anterior do diretor Martin McDonagh, Três Anúncios para um Crime, buscava aglutinar uma série de assuntos distintos (desejo de vingança; omissão das autoridades de Segurança; perda de confiança nas instituições; racismo; a possibilidade – ou não – de redenção até do pior dos seres humanos; etc), este novo projeto gira em torno de personagens cujas ações teimosas (e cada vez mais drásticas) nascem de conflitos tão triviais que se tornam engraçados ao serem trazidos para o centro da história e prolongados ao limite do absurdo – mas, ainda assim, sem nunca deixarem de soar humanos, verossímeis e mesmo melancólicos em suas naturezas.

Escrito e dirigido por McDonagh (que volta a trabalhar com Colin Farrell e Brendan Gleeson quatorze anos após o ótimo Na Mira do Chefe), Os Banshees de Inisherin se passa numa pequena – e fictícia – ilha irlandesa que, em 1923, vê a guerra civil aproximar-se do fim. É neste contexto que Pádraic, um sujeito desprovido de ambição e interessado apenas em curtir a vida nos bares locais, é surpreendido pela decisão abrupta do melhor amigo, Colm, de subitamente parar de falar com ele (“Eu não gosto mais de você”, diz o ex-companheiro sem oferecer mais explicações). Inconformado com o fim repentino da amizade, já que esta era constituía uma das principais razões para Pádraic levantar da cama, o protagonista passa, a partir daí, a correr insistentemente atrás de Colm a fim de tentar convencê-lo a rever sua posição, entender melhor o que levou o amigo a tomá-la ou apenas repreendê-lo por tê-la tomado – e o excesso de tentativas, é claro, deixa Colm tão impaciente que este começa a reagir de formas cada vez mais drásticas.

Provocando constantemente o riso sem jamais abrir mão do teor depressivo às margens, Os Banshees de Inisherin funciona graças ao equilíbrio perfeito – e dificílimo – que Martin McDonagh alcança entre o exagero (que muitas vezes chega na beirada da caricatura, mas é contrabalanceado por uma sobriedade que o impede de sê-lo) e a melancolia (afinal, imaginar uma pessoa querida passando a subitamente te considerar um problema a ser evitado, sem fornecer abertura para quaisquer tentativas de reconciliação, é dolorido por si só). Sim, nós frequentemente rimos (e, às vezes, ficamos em choque) diante da maneira com que os personagens elevam suas paranoias ao limite e sempre conseguimos entender (mesmo com restrições) as posturas de cada um, mas também nunca deixamos de sentir a mágoa que permeia cada ação/reação daqueles indivíduos ou a ternura de seus pequenos gestos (o apego de Pádraic com um burrinho denota um carinho genuíno e uma tentativa de manter alguma relação de amizade, ao passo que Colm nunca deixa de lamentar a mágoa que provoca no protagonista ao afastar-se). Neste sentido, a fotografia de Ben Davis exerce um papel determinante ao mergulhar o longa em uma paleta sombria, cinzenta, que ancora a narrativa em uma atmosfera sufocante – e, mesmo que o filme em si não o seja, isso ajuda a impedi-lo de se tornar minimamente caricato.

Mas boa parte do sucesso de Os Banshees de Inisherin – e de sua precisão ao equilibrar forças dramáticas tão distintas – é refletido pelas performances do elenco, que trazem peso e humanidade a personagens emocionalmente frágeis: por um lado, Colin Farrell transforma Pádraic num sujeito para o qual o amanhã jamais parece existir, preocupando-se apenas em terminar o dia podendo encher a cara e divertindo-se junto às pessoas das quais gosta (e é justamente esta falta de objetivo que o torna, também, inseguro quanto às impressões que provoca nos outros, entrando em paranoia ao saber que muitos de seus conterrâneos o consideram… chato); por outro, Brendan Gleeson acerta ao nunca retratar Colm não como um cara babaca ou insensível, mas como um homem que somente passou a ter maiores ambições (o que mais falta a Pádraic) e que, mesmo realmente querendo distância do então amigo, jamais deixa de preocupar-se explicitamente em preservar a integridade (emocional e física) deste. Enquanto isso, Kerry Condon posiciona Siobhán, a irmã de Pádraic, como um meio-termo entre os extremos representados pela dupla, demonstrando lealdade e real carinho pelo irmão mesmo sem deixar de entender os motivos que causaram o afastamento de Colm, ao passo que Barry Keoghan, que interpreta o jovem Dominic, praticamente se estabelece como reflexo de tudo que faz o filme, como um todo, funcionar, apresentando-se como uma figura ao mesmo tempo irreverente (ele gosta de provocar os outros) e triste (ele é vítima da violência do pai).

Pois são estes contrastes emocionais que tornam Os Banshees de Inisherin tão humano e, por consequência, tão eficaz – e, mesmo que as motivações de cada personagem possam aspirar a algo tematicamente simbólico (o fato de a trama se passar durante a guerra civil irlandesa – ou seja: num contexto marcado, entre várias outras coisas, pela destituição de laços há muito estabelecidos em função de posições históricas divergentes – certamente importa), o centro emocional e temático da obra está em decisões e conflitos essencialmente ordinários, comuns (desde a vontade de ser reconhecido e deixar um “legado” para as gerações futuras até o fato de que a passagem do tempo inexoravelmente implica em mudanças de perspectivas para quem o atravessa e em ambições que passam a não mais condizer com o estilo de vida inconsequente que se levava até então). Não é à toa que em dado momento, quando Colm explica o título da música que compõe, “Os Banshees de Inisherin”, a razão que o leva a adotá-lo nada tem de simbólico/profundo; apenas… a repetição de “sh” lhe pareceu sonoramente bacana.

Assim, Os Banshees de Inisherin é uma obra engraçada sem ser inconsequente, simples na motivação de seus dramas sem fazê-los soar fúteis  e – não menos importante – absurda sem deixar de ser doce e reveladora quanto às emoções de seus ótimos (e vulneráveis) personagens.

Assista também ao vídeo que gravei sobre o filme:

Mais para explorar

Gladiador II | Crítica

Mesmo contado com momentos divertidos e ideias interessantes aqui e ali, estas quase sempre terminam sobrecarregadas pelo tanto de elementos simplesmente recauchutados do original – mas sem jamais atingirem a mesma força.

Wicked | Crítica

Me surpreendeu ao revelar detalhes sobre o passado das personagens de O Mágico de Oz que eu sinceramente não esperava que valessem a pena descobrir, enriquecendo a obra original em vez de enfraquecê-la.

Ainda Estou Aqui | Crítica

Machuca como uma ferida que se abriu de repente, sem sabermos exatamente de onde veio ou o que a provocou, e cujo sofrimento continua a se prolongar por décadas sem jamais cicatrizar.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *