Rio 40 Graus

Título Original

Rio, 40 Graus

Lançamento

8 de fevereiro de 1956

Direção

Nelson Pereira dos Santos

Roteiro

Nelson Pereira dos Santos e Arnaldo de Farias

Elenco

Jece Valadão, Glauce Rocha, Roberto Batalin, Zé Keti, Modesto de Souza, Jackson de Souza, Sadi Cabral, Renato Consorte, Paulo Matozinho, Riva Blanche, Miguel Rosenberg, Paulo Montel, Arnaldo Montel, Al Ghiu, Castro Gonzaga e Martim Francisco

Duração

92 minutos

Gênero

Nacionalidade

Brasil

Produção

Nelson Pereira dos Santos, Mario Barros, Ciro Freire Cúri, Louis-Henri Guitton e Pedro Kosinski

Distribuidor

Sinopse

No Rio de Janeiro, em um dia de verão, cinco garotos pobres saem da favela onde vivem para vender amendoim pela cidade e presenciam casualidades e incidentes cariocas.

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Rio, 40 Graus | Crítica

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Ainda no primeiro ato de Rio, 40 Graus, de Nelson Pereira dos Santos, um morador de Copacabana vê um grupo de meninos carentes vendendo amendoins na praia e, com ar de superioridade, diz: “Como estão impossíveis, até parecem suburbanos”. É difícil escutar esta frase e não se lembrar de um caso que ocorreu em 2014 quando uma professora da PUC fotografou um homem despojado num aeroporto e sarcasticamente perguntou se aquilo “havia virado uma rodoviária”. Assim, é inquestionável que Rio, 40 Graus permanece atual até os dias de hoje – e não só ao retratar os preconceitos elitistas, mas ao mostrar o estilo de vida do carioca de modo geral.

Roteirizado também por Nelson Pereira dos Santos (ao lado de Arnaldo de Farias, que não foi creditado), o longa se concentra em diferentes núcleos que habitam na cidade do Rio de Janeiro, porém em condições distintas entre si. Na trama, acompanhamos uma partida de futebol com jogadores inseguros, meninos que vendem amendoins e pedem esmolas, um coronel que vem de Minas Gerais a fim de tornar-se deputado e não apenas um, mas dois casamentos: um entre dois moradores de uma comunidade e outro entre um marinheiro e uma jovem que já está grávida.

Como dá para perceber, Rio, 40 Graus gira em torno basicamente… do Rio de Janeiro: misturando histórias elaboradas e imagens que podem ser descritas como semidocumentais, Nelson Pereira dos Santos começa a projeção com várias tomadas aéreas que exaltam as paisagens emblemáticas da “Cidade Maravilhosa”, desde as praias de Copacabana até os palácios icônicos (nem é preciso dizer que o Cristo Redentor e o bonde do Pão de Açúcar aparecem nesta abertura, pois seria óbvio demais). Mas o filme não enfoca somente a parte mais glamorosa do Rio, já que a maioria das personagens pertence às classes menos privilegiadas da pirâmide social.

E nisso a obra volta a tocar nos temas apresentados no primeiro parágrafo, saltando de um grupo de riquinhos que enxergam com desprezo os pedintes ao seu redor até moradores de comunidades que têm sérias dificuldades econômicas – e não deixa de ser sintomático que, em certo momento, um trabalhador prestes a se casar encontra um conhecido na rua e se sente feliz ao afirmar que, em seu novo emprego, “tem salário mínimo e tudo” (ou seja: o simples fato de haver um salário mínimo é uma grande vitória para o sujeito). Além disso, no início da história, um guarda expulsa um menino negro de um parque apenas por ser… negro – e mais tarde, um policial conduz o garoto de volta à comunidade onde mora com o claro intuito de prendê-lo.

Mas isto não significa que o filme não conte com qualquer resquício de humor ao debater seus temas, já que o grupo de meninos que passa a narrativa inteira vendendo amendoins (do Maracanã ao Pão de Açúcar) protagoniza alguns momentos notavelmente divertidos e que, em algumas ocasiões, beiram o caricato – um bom exemplo disto ocorre quando um menino (que fuma) resolve “ensinar” o outro a pedir esmola de um jeito mais eficaz. E isso jamais enfraquece a relevância temática da obra, já que o bom humor é empregado a fim de fortalecer sua discussão (ao conversar casualmente com um amigo, o menino avista um charmoso Cadillac e interrompe o diálogo com um ligeiro e hilário “Ih, um Cadillac!”). Até mesmo algumas grosserias que saem das bocas de alguns elitistas tornam-se engraçadas justamente por serem tão absurdas.

Montado por Rafael Justo Valverde de maneira consistentemente dinâmica e objetiva (o que é indispensável numa narrativa que envolve tantas subtramas e personagens distintas – é importante haver fluidez na hora de saltar de um núcleo ao outro), Rio, 40 Graus ainda utiliza a montagem para criar algumas piadas bastante eficazes – como o raccord que une um quase atropelamento aqui e um gol que é comemorado ali. Para completar, a cultura carioca está devidamente representada no longa, o que se deve não só às paisagens da cidade, mas à trilha sonora de Radamés Gnattali e, claro, do fabuloso Zé Keti, um dos maiores gigantes do samba que o Rio de Janeiro já concebeu.

Servindo como um dos pontos de partida para o movimento do Cinema Novo, que se dedicou – entre muitas outras coisas – a expor o Brasil como ele é de fato, Rio, 40 Graus chegou a ser censurado pela ditadura militar por ser considerado uma grande “mentira”. Hoje, basta observar a realidade ao redor do carioca para perceber o quão realista é a “Cidade Maravilhosa” mostrada aqui – mesmo com a comicidade particular e quase caricata de Nelson Pereira dos Santos.

(Texto originalmente escrito como trabalho da matéria de Crítica para a faculdade FACHA em parceria com a colega – e amiga – Rayssa Guenther.)

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