CODA

Título Original

CODA

Lançamento

23 de setembro de 2021

Direção

Sian Heder

Roteiro

Sian Heder

Elenco

Emilia Jones, Troy Kotsur, Daniel Durant, Marlee Matlin, Eugenio Derbez, Ferdia Walsh-Peelo, Amy Forsyth e Kevin Chapman

Duração

111 minutos

Gênero

Nacionalidade

EUA

Produção

Fabrice Gianfermi, Philippe Rousselet, Jerôme Seydoux e Patrick Wachsberger

Distribuidor

Amazon Prime Video

Sinopse

Ruby, de 17 anos, é a única pessoa que ouve em uma família de surdos. Quando o negócio de seus pais é ameaçado, ela fica dividida entre seu amor pela música e suas obrigações.

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No Ritmo do Coração (CODA) | Crítica

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O estigma de que remakes são fruto de pura e simples “falta de originalidade” me parece um pouco injusto, já que não são poucos os exemplos de releituras que não só justificam a própria existência como às vezes superam as originais. Dito isso, também não posso simplesmente fingir que não entendo de onde vem esta generalização comum sobre as refilmagens: a quantidade de exemplos que de fato não passam de meros caça-níqueis é inequívoca e – pior – cada vez maior. Encontrar exemplos de remakes hollywoodianos de obras produzidas no exterior, então, é mais difícil ainda, já que a própria natureza destas versões americanizadas parte de um propósito simplificador, pegando algo que se destacou no exterior e padronizando-o a fim de atender às massas estadunidenses que detesta ler legendas.

Neste sentido, um filme como CODA (me recuso a usar a ridícula tradução brasileira, No Ritmo do Coração) acaba constituindo uma proeza rara: além de uma refilmagem bastante eficiente em sua proposta, se revela também uma adaptação hollywoodiana possivelmente melhor que o longa francês que a inspirou, o bacana A Família Bélier. (Aliás, não deixa de ser irônico que, embora a motivação da maioria dos remakes norte-americanos seja atender ao público americano que “não quer ler legendas”, ainda assim a maior parte de CODA gire em torno de diálogos que, em francês ou em inglês, acabarão dependendo de legendas para serem compreendidos por uma parcela considerável da audiência.)

Escrito e dirigido por Siân Heder (cujo maior destaque do currículo era a série Orange Is the New Black), CODA reconta exatamente a mesma história que vimos em A Família Bélier, mudando apenas os nomes, as nacionalidades e as profissões dos personagens: residentes na pequena cidade de Gloucester, em Massachusetts, os Rossi são uma família de pescadores surdos composta pelo pai Frank, pela mãe Jackie, pelo filho mais velho Leo e pela adolescente Ruby – esta última a única da casa que não é surda e que, com isso, ajuda a facilitar a interação entre sua família e o resto da comunidade na qual moram, traduzindo simultaneamente de libras para inglês e vice-versa. Porém, a relação entre Ruby e seus familiares começa a ficar tensa depois que a garota decide entrar para o coral da escola e, por consequência, tentar uma vaga na Faculdade Berklee de Música, em Boston, distanciando-se dos pais e do irmão justo quando eles iam investir num novo e ousado negócio: uma companhia autônoma de venda de peixes, para bater de frente com a empresa que gerenciava a pescaria em Gloucester até então e que apenas explorava e empobrecia os trabalhadores enquanto lucrava às custas de seus trabalhos manuais.

Não, não há nada de “original” na premissa de CODA, algo que se torna ainda mais patente quando consideramos que se trata não apenas de um remake, mas de um remake de um filme que já era por si só bastante simples nas situações que imaginava e nos arcos que criava para os personagens. Mas aí, sou obrigado a retornar àquilo que já discuti inúmeras vezes: o que importa em uma obra não é sobre o que ela fala, mas como ela fala – e até a mais batida das premissas é capaz de render resultados fascinantes dependendo das novas abordagens conferidas a ela. Neste sentido, é curioso que eu tenha assistido a CODA pouquíssimos dias após conferir Encanto: se por um lado a animação da Disney era fragilizada pela falta de imaginação dos realizadores, falhando em conferir qualquer personalidade que a tornasse singular ou memorável, o longa de Siân Heder basicamente pega a estrutura do filme que o inspirou e a utiliza como planta-base para retrabalhá-la de forma mais elaborada e coesa.

Hábil ao amarrar uma série de pequenos núcleos que pareciam “soltos” em A Família Bélier (a ideia do pai se candidatar a prefeito, que soava bem forçada no original, aqui é substituída pela opção dele de criar uma companhia autônoma de venda de peixes, o que se conecta com o fato de desde o início os personagens serem pescadores), CODA é eficaz ao justapor os objetivos particulares da garota aos de sua família, posicionando a garota como uma estranha dentro da própria casa – uma casa que, aliás, reflete bem mais a personalidade caótica e bagunçada de seus ocupantes do que a residência bonitinha que, no original, abrigava a família Bélier. Assim, ao dividir a narrativa entre os objetivos dos Rossi e as ambições particulares de Ruby, interligando-as em pontos específicos da história, a diretora/roteirista Siân Heder consegue estabelecer melhor não só a intensidade dos objetivos da protagonista (seu sonho de cursar Música longe; a descoberta de seu primeiro interesse amoroso), mas como estes entram em conflito com o compromisso de atender às necessidades dos pais e do irmão.

Assim, CODA é bem-sucedido ao costurar situações que, juntas (ou sobrepostas), ajudam a criar uma base mais forte para os dramas que serão retratados ao longo da projeção, criando um quadro de real tensão à medida que a trama se desenrola e, com isso, vamos percebendo como os dois lados da vida de Ruby (os laços com a família vs. a vontade de seguir rumos profissionais/pessoais próprios) canibalizam um ao outro. Ao mesmo tempo que sentimos agonia por constatar que a garota se atrasará pela milionésima vez para a aula de canto, tememos pela dor que seus pais e seu irmão experimentarão e/ou provocarão por verem a filha – uma peça tão fundamental para a família – entrar em conflito e desaparecer. Neste processo, CODA pode não ser uma obra que se destaca em termos de estilo ou linguagem (A Família Bélier também não era), mas certamente é bem-sucedida em estabelecer os alicerces dos sentimentos que pretende comunicar/despertar – o que também se aplica às tentativas de humor do longa, que provocam o riso por não temerem explorar com as vulgaridades, grosserias e excentricidades dos personagens de modo ainda mais explícito do que no original.

Encontrando espaço até mesmo para um subtexto claro sobre mais-valia e sobre como os trabalhadores devem ter direito a uma remuneração proporcional ao serviço que prestam (em vez de ganharem salários miseráveis às custas de patrões que sugam tudo que eles colhem), CODA é um filme cuja força reside mesmo no imenso afeto que a cineasta Siân Heder consegue estabelecer entre aqueles personagens, articulando a interação dos sentimentos de cada um deles com cuidado e coesão – e a prova disso está no fato de que, quando chegamos ao clímax da narrativa, realmente sentimos e entendemos o impacto daquele desfecho como o ápice lógico de uma escalada emocional construída com cuidado ao longo da hora e meia que o antecedeu.

Mas talvez a cena mais memorável do longa seja a que traz Ruby e Frank (Emilia Jones e Troy Kotsur, fantásticos) sentados na caçamba de sua picape enquanto a filha canta para o pai e este, incapaz de ouvir o que sai da boca da menina, coloca delicadamente as mãos em seu pescoço a fim de sentir as vibrações de suas cordas vocais. É este tipo de delicadeza sutil, construída mais por olhares e gestos íntimos do que por falas e reações expositivas, que transforma CODA em uma grata surpresa.

***

(Lembre-se: a pandemia não acabou. Se for sair de casa e ir ao cinema, siga todos os cuidados sugeridos pelas organizações sérias de Saúde: use máscara, mantenha uma distância segura dos demais espectadores, evite se aglomerar e – o mais importante – vá ao posto tomar sua vacina. Se já tomou a primeira dose, tome a segunda. Se já tomou a segunda e já chegou a vez de tomar a terceira, tome a terceira – se ainda não chegou, espere e vá assim que ela estiver disponível. É triste ter que escrever isto, mas… não escute o atual presidente da República (ou mesmo seu ministro da Saúde): vacine-se e proteja-se. Só assim conseguiremos construir um caminho para finalmente vencermos a COVID-19 e sairmos desta crise que ninguém aguenta mais. #ForaBolsonaro)

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