Operação Red Sparrow é mais ou menos o que Atômica seria se fosse dirigido pelo cadáver de Um Morto Muito Louco (isto é, se pertencesse ao gênero “suspense” em vez de representar o da “ação”). Ok, talvez essa afirmação seja um pouco injusta se levarmos em conta que os primeiros minutos do longa são admiráveis: intercalando a missão de um agente da Cia com a apresentação de uma bailarina (que culmina no acidente que desencadeia toda a trama), a abertura é conduzida com charme e elegância por Francis Lawrence, costurando as duas situações paralelas através da trilha sonora requintada e permitindo que o diretor de fotografia Jo Willems encontre espaço para compor alguns planos belíssimos. A impressão causada era a de que uma obra estilosa e interessante estava começando – e é uma pena que, nas duas horas seguintes, Operação Red Sparrow revele-se tão aborrecido e autoindulgente.
Escrito por Justin Haythe (O Cavaleiro Solitário e A Cura) a partir do livro de Jason Matthews, o roteiro se passa na Rússia e nos apresenta a Dominika Egorova, uma jovem que sempre sonhou em ser bailarina e, quando estava prestes a conquistar seu objetivo, acaba tendo sua perna quebrada por um colega de palco, o que arruína as chances de prosseguir na carreira que desejava. A partir daí, o tio da garota lhe oferece a oportunidade de se tornar uma “Red Sparrow” – ou seja: uma espiã que seduz seus oponentes para neutralizá-los em seguida (pensem na Viúva Negra, d’Os Vingadores). O que ela não esperava é que fosse desenvolver um apego tão forte por Nate Nash, um agente da CIA com quem se envolve eventualmente e põe em cheque a fidelidade que jurou preservar pelo governo russo.
Como já dá para notar, Operação Red Sparrow não faz muita questão de evitar clichês – o que, é claro, não justifica os problemas gerais do filme, que poderia abordar uma premissa batida de forma engajante se fizesse um esforço maior. Além de jamais despistar o fato de que se trata de mais uma velha historinha sobre um amor proibido que leva uma personagem a se desprender dos seus valores (e assumir riscos por isto), o fraquíssimo roteiro comete um erro pior – e mais irritante – do que construir uma trama previsível como um todo: investir em pequenos momentos que tentam gerar tensão, mas que deixam o espectador adivinhar exatamente o que acontecerá nos próximos segundos. Assim, quando a protagonista vê um casal correndo para dentro de uma sala quente e esfumaçada, é óbvio que os dois serão pegos transando lá dentro; quando certa coadjuvante é intimidada por homens estranhos na rua e começa a recuar até chegar à rua, é lógico que um atropelamento ocorrerá a seguir; e quando a virada do seguido para o terceiro ato é pontuada por uma reviravolta verdadeiramente surpreendente, essa surpresa é desfeita de imediato e recoloca a trama no caminho previsível que seguia até então.
Desenvolvendo personagens genéricos e unidimensionais cujos arcos dramáticos nunca soam minimamente interessantes ou convincentes, Operação Red Sparrow é daqueles filmes que, mesmo contando uma história ambientada em Moscou, trazem um elenco majoritariamente composto por ingleses e norte-americanos que falam inglês da primeira à última cena (para entender o quão louca é a situação, basta se ater ao fato de que Jeremy Irons está fazendo o papel de um general russo). Mas o pior não é isso: o que mais frustra aqui é perceber como o roteiro é incapaz de conferir qualquer tipo de densidade às personas que vemos em tela – e, neste sentido, seria injusto criticar Jennifer Lawrence por não transformar Dominika numa protagonista intrigante, já que a personalidade da espiã vai de “jovem cujos sonhos foram destruídos” até “máquina de sedução e captura” com uma rapidez que não permite qualquer tipo de aprofundamento nas respectivas nuances (aliás, é triste que, após o brilhante mãe!, Lawrence talvez esteja voltando ao baixo nível de obras como Joy e Passageiros). Enquanto isso, Joel Edgerton é… o cara que vai se apaixonar pela heroína (e isto é o máximo que posso dizer sobre sua presença em cena).
Para completar a decepção, o cineasta Francis Lawrence (da série Jogos Vorazes, onde também trabalhou com Jennifer – não, os dois não são parentes) ainda tropeça ao dirigir o projeto de forma desnecessariamente sisuda e pausada, o que inclusive faz Operação Red Sparrow soar pretensioso (como se fingisse uma solenidade excessiva a fim de ser levado a sério). O maior pecado do diretor, no entanto, não é estender a duração a ponto de alcançar longos 140 minutos (e exigindo demais da paciência do espectador no processo); o que realmente incomoda é constatar como Lawrence descarta qualquer potencial dramático ao já iniciar o filme apostando na frieza absoluta, sem estabelecer apelo emocional algum antes disso. Ora, se a narrativa começasse com mais intensidade e aos poucos fosse abraçando a insipidez, isto refletiria o próprio arco da protagonista de modo inteligente (afinal, ela mesma vai ficando menos emotiva conforme a história avança). Em vez disso, o realizador prefere atirar a decisão no lixo e criar uma trama sem qualquer escalada, ápice ou recompensa que funcione adequadamente.
Sem jamais conseguir abordar o sexo de maneira particularmente inventiva ou interessante, falhando ao discutir o uso do fetiche como técnica de combate e ao fazer da sedução uma característica intrínseca à personalidade da protagonista, Operação Red Sparrow não é muito mais do que uma mera desculpa para mostrar Jennifer Lawrence nua diante da câmera, contando um fiapo de história para amarrar as cenas que exploram o corpo da atriz. Esta, inclusive, é uma frase que poderia perfeitamente ser empregada para definir uma produção pornô – o que, convenhamos, não deve ser um motivo de orgulho para este filme, não é mesmo?