Parasita

Título Original

Gisaengchung

Lançamento

7 de novembro de 2019

Direção

Bong Joon-ho

Roteiro

Bong Joon-ho e Han Jin-won

Elenco

Choi Woo-shik, Song Kang-ho, Jang Hye-jin, Park So-dam, Lee Sun-kyun, Cho Yeo-jeong, Jung Ji-so, Jung Hyun-joon, Lee Jung-eun e Park Myung-hoon

Duração

132 minutos

Gênero

Nacionalidade

Coreia do Sul

Produção

Bong Joon-ho, Kwak Sin-ae, Moon Yang-kwon e Jang Young-hwan

Distribuidor

Pandora Filmes

Sinopse

Toda a família de Ki-taek está desempregada, vivendo num porão sujo e apertado. Uma obra do acaso faz com que o filho adolescente da família comece a dar aulas de inglês à garota de uma família rica. Fascinados com a vida luxuosa destas pessoas, pai, mãe, filho e filha bolam um plano para se infiltrarem também na família burguesa, um a um. No entanto, os segredos e mentiras necessários à ascensão social custarão caro a todos.

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Parasita | Crítica

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Às vezes, um filme se propõe a debater os problemas internos do país no qual foi produzido, mas também acaba debatendo problemas do mundo inteiro. Embora localizado na Coreia do Sul (e buscando retratar a realidade de lá), Parasita coloca seus personagens e sua narrativa no centro de uma discussão a respeito da desigualdade social estimulada pelo capitalismo selvagem, o que já é o suficiente para caracterizá-lo como uma obra bem mais universal do que poderíamos supôr. Assim, o novo longa do excelente Bong Joon-ho (Memórias de um AssassinoExpresso do AmanhãOkja) se apresenta como um retrato da luta de classes em um contexto obviamente sul-coreano, mas que também se reflete em inúmeros outros países – em especial, o Brasil. E o mais admirável: o faz de maneira dramaticamente fascinante.

Escrito por Joon-ho ao lado de Han Jin-won, Parasita nos apresenta aos pobres integrantes da família Kim: o jovem Ki-woo, sua irmã Ki-jung, o pai Ki-taek e a mãe Chung-sook. Vivendo apertados no porão de um prédio devastado, trabalham fazendo embalagens para uma pizzaria da região, dividem comida com seus vizinhos (também miseráveis) e só têm um mínimo acesso à Internet quando se conectam no wi-fi de outros moradores do bairro. No entanto, depois que um amigo de Ki-woo o pede para substitui-lo como professor de inglês da filha do milionário Park Dong-ik, os Kim finalmente vêm uma oportunidade de ganhar um dinheiro a mais e melhorar um pouco suas condições de vida. Mas isto não é o suficiente: aos poucos, Ki-woo começa a bolar planos para que Ki-jung, Ki-taek e Chung-sook também passem a trabalhar na mansão dos Park – sempre disfarçando o fato de eles todos pertencerem à mesma família, é claro. A partir daí, vários eventos vão se desenrolando e… bem, vão deixando a história ainda mais complexa do que já estava.

Complexo ao estabelecer as índoles dos personagens e as relações entre cada um destes, Parasita encara tanto a família Kim quanto a Park de maneira lúcida e verossímil, evitando representações fáceis e superficiais: por um lado, os protagonistas nunca se reduzem somente a pobres coitados, tomando uma série de atitudes que, mesmo motivadas pelo compreensível desejo de bater de frente com a elite, se revelam cada vez mais reprováveis do ponto de vista ético; por outro, os antagonistas são retratados não como vilões, mas como indivíduos que, por serem tão privilegiados (e apegados aos seus privilégios), se tornam incapazes de entender a realidade de seus empregados miseráveis. Além disso, é admirável que o filme confira personalidade a cada um dos quatro integrantes da família Kim: Ki-woo é um rapaz surpreendentemente equilibrado entre suas ambições particulares (notem seu envolvimento com a filha dos Park) e a “missão” que assumiu para com seus parentes; Ki-jung é uma garota sagaz, espirituosa e que, justamente por isso, não demora a se estabelecer como a mente por trás dos golpes praticados pelos familiares; Ki-taek está mais interessado em preservar o bem estar de seus entes queridos mesmo participando de um monte de esquemas moralmente questionáveis; e Chung-sook demonstra afeto pelos filhos e pelo marido sem abrir mão da praticidade em meio à situação na qual se encontra.

Surpreendente também em suas “pistas e recompensas” (uma pedra aparentemente inútil apresentada no primeiro ato retorna de maneira crucial no terceiro; as luzes que acendem sincronizadas quando o senhor Park chega em casa mais tarde ganham uma conotação bem mais brutal do que poderíamos imaginar; etc), o roteiro de Parasita é brilhante por si só, mas não funcionaria caso a direção de Bong Joon-ho não fizesse jus a ele – e é um alívio, portanto, que o cineasta não só corresponda às expectativas como ainda realize um dos melhores trabalhos de sua carreira. Exibindo uma segurança notável ao conduzir a narrativa, Joon-ho confere leveza e bom humor à primeira metade da projeção e surpreende ao saltar para uma atmosfera bem mais urgente e dramática a partir da segunda, atingindo um clímax particularmente trágico e que funciona justamente pela construção inteligente que o antecipou. Aliás, são poucos os filmes que fazem o espectador rir, se sentir tenso e se emocionar na mesma medida e sem que uma reação elimine a outra – e o fato de conseguir isto comprova a habilidade de Joon-ho.

Mas um dos aspectos mais importantes de Parasita é a forma como estabelece o contraste entre o mundo dos Kim e o dos Park, acentuando a disparidade social/econômica entre as duas famílias – e, neste sentido, o design de produção de Ha-jun Lee desempenha um papel fundamental ao retratar as moradias de cada uma delas: por um lado, os Kim vivem sufocados em um porão apertado, composto de azulejos caindo aos pedaços e que, confesso, me lembrou mais os fundos de um restaurante do que um apartamento comum; por outro, os Park levam uma vida confortável em uma mansão espaçosa, arquitetada de maneira elegante e dotada de uma tecnologia que se manifesta das câmeras de segurança aos controles remotos que regulam praticamente tudo na casa. Ao mesmo tempo, a montagem de Jinmo Yang se mostra afiada ao saltar de uma cena situada no conforto dos Park para outra ambientada no sufoco dos Kim, contrapondo ambos os núcleos de forma pontualmente sarcástica.

O contraste entre os Kim e os Park, aliás, é o ponto-chave de Parasita, já que a maior preocupação de Bong Joon-ho nesta obra é, obviamente, a distância cada vez maior entre os mais ricos e os mais pobres (um conceito que ele já tinha abordado de forma metafórica – mas nada sutil – em Expresso do Amanhã). Se estabelecendo como uma representação lógica do sonho não só de ascender socialmente, mas de fazer os privilegiados terem uma pequena ideia de como é não ter privilégio algum, o longa se encarrega de mostrar como a elite pode até não demonstrar ódio pelos empregados que vive explorando, mas também nunca se dará ao trabalho de abrir mão de suas regalias (o que me lembrou uma frase de Que Horas Ela Volta?: “Quando eles (os patrões) nos oferecem alguma coisa deles, é por educação; eles têm certeza que a gente vai dizer ‘não’“). E é esta exploração que inevitavelmente resulta em atitudes extremas, provocando ainda mais tragédias na maioria das vezes – o terceiro ato, inclusive, é eficiente ao retratar como uma vida inteira de desigualdades acaba culminando em dores irremediáveis.

Neste sentido, é curioso que Parasita já seja o favorito ao próximo Oscar de Melhor Filme Internacional, já que isto naturalmente permite uma comparação com o último vencedor do prêmio nesta mesma categoria: Roma. Ambos giram em torno de personagens localizados na linha de pobreza e que, justamente por isso, são explorados por aqueles que se encontram nos degraus mais altos da pirâmide social. No entanto, se o filme de Alfonso Cuarón sugeria que o carinho (autêntico?) de uma família branca de classe média alta podia compensar o sofrimento da empregada Cleo, o de Bong Joon-ho não se mostra nem um pouco condescendente com os patrões dos Kim, demonstrando um interesse real em denunciar a exploração em si.

E é importante que Parasita denuncie isto, pois só assim para sermos lembrados de como a parcela mais pobre da Sociedade sofre enquanto a elite continua desfrutando de seus privilégios. Para quem leva uma vida confortável, algo trivial como uma pancada de chuva pode representar uma “bênção” que veio para acabar com o calor; para quem permanece mergulhado na miséria, a mesma pancada de chuva pode deixá-los desalojados e, muitas vezes, até enlutados.

Já para o prefeito da cidade, basta aparecer na TV e se dizer “solidário” com as famílias que perderam o pouco que tinham mesmo sem mover uma palha para tentar ajudá-las.

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