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Título Original

A Complete Unknown

Lançamento

27 de fevereiro de 2025

Direção

James Mangold

Roteiro

James Mangold e Jay Cocks

Elenco

Timothée Chalamet, Elle Fanning, Monica Barbaro, Edward Norton, Boyd Holbrook, Dan Fogler, Norbert Leo Butz, Eriko Hatsune, Big Bill Morganfield, Will Harrison, Scoot McNairy, P. J. Byrne, Michael Chernus, Charlie Tahan, Ryan Harris Brown, Eli Brown, Nick Pupo, Laura Kariuki, Stephen Carter Carlsen, Eric Berryman, David Alan Basche, Joe Tippett, James Austin Johnson, Kayli Carter, Sarah King, Alaina Surgener, Will Price, Joshua Henry e Molly Jobe

Duração

141 minutos

Gênero

Nacionalidade

EUA

Produção

James Mangold, Timothée Chalamet, Peter Jaysen, Alex Heineman, Bob Bookman, Alan Gasmer, Jeff Rosen e Fred Berger

Distribuidor

Disney

Sinopse

O jovem Bob Dylan chega a Nova York com seu violão e talento revolucionário. Na cidade, os seus relacionamentos mais íntimos são formados durante sua ascensão à fama. Em sua jornada, ele fica inquieto com o movimento folk, fazendo uma escolha controversa que reverbera no mundo todo.

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Um Completo Desconhecido | Crítica

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Um dos grandes artistas do século 20 (e um dos principais nomes a definirem a década de 1960 como o período de absurda efervescência cultural que foi), Bob Dylan é um criador que domina como poucos a arte de criar letras que exprimem e sintetizam sentimentos/temas/ideias que nós, do outro lado, simplesmente não saberíamos traduzir em palavras – e, de quebra, ainda as embalava em melodias lindas que se tornavam ainda mais tocantes graças à entrega e sinceridade de Dylan ao recitá-las. Além disso, é também um artista que se reinventou tantas vezes, desafiando os limites dos gêneros pelos quais se notabilizou, que em 2007 o cineasta Todd Haynes julgou necessário escalar atores completamente diferentes (Cate Blanchett, Christian Bale, Richard Gere, Heath Ledger, Ben Whishaw e Marcus Carl Franklin) para encarnarem as diferentes “fases” de Dylan, através de pseudônimos, no ótimo Não Estou Lá.

Um Completo Desconhecido, por sua vez, já é uma biografia um pouco mais convencional que, em vez de abranger toda a trajetória pessoal/profissional de Bob Dylan, prefere se delimitar a um recorte específico: tomando como base o livro Dylan Goes Electric!, escrito por Elijah Wald, o roteiro escrito por Jay Cocks e pelo diretor James Mangold se concentra na vontade do protagonista de querer se renovar e, claro, sua polêmica transição para a guitarra elétrica, que despertou a ira dos fãs tradicionalistas de folk e culminou na fatídica noite de 25 de julho de 1965, quando Dylan subiu no palco do Festival de Folk de Newport com uma banda plugada a um amplificador e tocando, entre outros instrumentos, guitarras elétricas (que tinham acabado de chegar à cena musical e geravam aquelas acusações – bem típicas de quando surge alguma forma nova de linguagem/técnica – de serem “uma deturpação do modo verdadeiro de se fazer-se música”). O resultado não tinha como ser diferente: Dylan foi recebido com vaias e gritos de “traidor”.

O que, contudo, não o impediu de prosseguir com um show que atingiu o ápice no momento em que cantou/tocou a emblemática “Like a Rolling Stone” – cujo refrão, como podem perceber, serve de inspiração para o título desta cinebiografia (“Like a Complete Unkown // Like a Rolling Stone”).

Criando uma narrativa que pode até ser formulaica em sua estrutura, mas que é eficaz ao conquistar e envolver a partir de dramas que humanizam o biografado (algo que o próprio James Mangold já fizera há 19 anos em Johnny & June, sobre o romance entre Johnny Cash e June Carter), Um Completo Desconhecido já larga com vantagem ao demonstrar imenso respeito pelas canções que tem à disposição, interessando-se não só em entender por que estas tocavam o público, mas também como refletiam o momento histórico que as cercava (e o roteiro é hábil ao fazer isso de forma orgânica, sem ter de interromper a narrativa para mostrar como andava o mundo nos anos 1960 para que, então, entendamos o teor daquelas músicas). Além disso, sempre que retrata uma destas canções, Mangold dedica um espaço considerável para tocá-las na íntegra (ou em boa parte), não sentindo a ânsia de cortar logo temendo que o público venha a ficar impaciente – e esta decisão ajuda a ressaltar ainda mais o deslumbramento que aquelas letras e composições geram no público e nos demais personagens.

Em contrapartida, Um Completo Desconhecido ganha pontos também por evitar ser “chapa branca” como a maioria de seus colegas de gênero – e, se não chega ao ponto de retratar Dylan como um ser execrável, tampouco perde a chance de pintá-lo como um cara difícil, um homem tão convicto da própria aura mística que acaba ultrapassando todos os limites da arrogância (e convenhamos que, às vezes, apresentar um artista como um babaca é muito mais danoso à sua reputação do que transformá-lo em um monstro). Neste sentido, é claro que o desempenho do ator que interpreta o biografado se torna algo central, já que é capaz ou de elevar o projeto como um todo, ou de afundá-lo por completo. Dito isso, quando o Bob Dylan de Timothée Chalamet abre a boca pela primeira vez, recitando sua linha de diálogo inicial, confesso que, sim, me causou um estranhamento que por um minuto me fez pensar: “Vixe, não vai rolar”.

Felizmente, à medida que a narrativa avança, Chalamet captura o espírito do personagem o suficiente para escapar da caricatura, resgatando a voz de Dylan sem soar artificial e equilibrando bem entre a genialidade (legítima, afinal) do artista e o ego que tende a torná-lo tão volátil – e, ao contrário do que ocorreu com Rami Malek em Bohemian Rhapsody, Sophie Charlotte em Meu Nome é Gal e Marisa Abela em Back to Black, me admira bastante o fato de Chalamet realmente cantar na própria voz em vez de “dublar” as músicas originais. Enquanto isso, Edward Norton ilustra bem a confiança de Pete Seeger em Dylan se convertendo aos poucos num medo do que a cabeça sem limites do protagonista inventará, ao passo que Monica Barbaro é bem-sucedida ao incutir a força artística e de espírito de Joan Baez, que mostra-se capaz de bater de frente com a insolência do biografado. Para completar, Elle Fanning exibe uma delicadeza notável ao compor o apego pessoal que Sylvie não consegue deixar de ter por Dylan, a dor por ver a fama monstruosa distanciando-o dela e do mundo real e, não menos importante, o respeito que ela se dá por largar o cantor/namorado de vez.

Dito isso, Um Completo Desconhecido não escapa de alguns problemas costumeiros destas biografias – e o principal deles é a dificuldade do filme em registrar o transcorrer do tempo: se a primeira metade do longa costura bem o avanço cronológico dos eventos e o encadeamento que leva um ao outro, na reta final as coisas começam a ficar corridas demais, saltando de um “episódio” ao outro de maneira brusca a ponto de deixar umas lacunas entre um e outro (há um momento, por exemplo, em que uma elipse nos traz a 1965 e, quando chegamos ao ano em questão, Dylan está com uma namorada que, após dois minutos, o abandona na rua – e, por mais que o longa tente vender aquele momento como algo dramaticamente relevante, a verdade é que, como aquela personagem tinha acabado de ser introduzida, o impacto do término em si é anulado). E se a (primeira) separação entre Dylan e Sylvie é apenas citada de forma passageira, a transição do protagonista para a guitarra elétrica (que, afinal, é o centro das atenções do projeto) soa mal estabelecida, já que o interesse dele pelo instrumento não tinha sido formado com cuidado ao longo da narrativa – e, da mesma forma, o roteiro tampouco explora o motivo pelo qual a guitarra elétrica causou tamanha controvérsia (eu sei porque já conhecia a história real, mas se fosse depender apenas do que é trabalhado pelo filme, não seria o suficiente).

Seguindo rigorosamente a estrutura básica de praticamente todas as cinebiografias (o que é uma pena, já que tira a individualidade de artistas tão diferentes entre si), Um Completo Desconhecido é, de um ponto de vista formal, uma obra um tanto “quadrada” e dirigida por James Mangold sem um grama de originalidade estética, empregando seus aspectos técnicos/estilísticos de modo a apenas… cumprir uma função – e não mais que isso. E se a fotografia de Phedon Papamichael usa bem o contraponto entre as luzes dos holofotes e as sombras no palco, isolando Bob Dylan da plateia ao recortar sua silhueta através da contraluz (e criando planos plasticamente bonitos que sintetizam a melancolia e o distanciamento do cantor), também não dá para dizer que haja qualquer aspecto muito inventivo nestas mesmas decisões, reforçando como o filme é bastante eficiente ao entregar o que lhe é dado para executar), mas não chega a elaborar muito a partir disso.

Por outro lado, Um Completo Desconhecido é um filme que, mesmo com estes contratempos, conquista ao reforçar uma ideia em particular que anda sendo esquecida nas últimas décadas: a importância de o artista preservar sua voz particular. Sim, a indústria cultural e a lógica da idolatria por figuras populares (leia-se: os fandoms que desprezo até o fundo da alma) habituaram os espectadores a esperarem que o realizador faça sempre o que eles querem, como se o cantor/autor/cineasta/etc fosse um “faz-tudo” do público quando, na verdade, o que deveria se sobressair na Arte é o que o artista pretende expressar. E é por isso que valorizo Bob Dylan por criar aquilo que deseja mesmo que a reação da plateia (que acredita ser sua “fã”, mas que nada entendeu de sua obra) seja a de vaiá-lo.

Que James Mangold enxergue esta posição de Dylan como algo a ser admirado em vez de repelido já é, por si só, algo que engrandece Um Completo Desconhecido. Afinal, é importante que o artista tenha o pulso firme de desafiar – e, quando necessário, frustrar – seu público em vez de tornar-se um vassalo que o mimará a todo custo e que reduzirá sua própria subjetividade a um produto destas massas consumidoras.

Assista também ao vídeo que gravei sobre o filme:

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