Watchmen - O Filme

Título Original

Watchmen

Lançamento

6 de março de 2009

Direção

Zack Snyder

Roteiro

David Hayter e Alex Tse

Elenco

Jackie Earle Haley, Patrick Wilson, Malin Åkerman, Billy Crudup, Matthew Goode, Jeffrey Dean Morgan, Carla Gugino, Stephen McHattie, Matt Frewer, Danny Woodburn e Robert Wisden

Duração

163 minutos

Gênero

Nacionalidade

EUA

Produção

Lawrence Gordon, Lloyd Levin e Deborah Snyder

Distribuidor

Paramount Pictures

Sinopse

Em 1977, foi aprovada pelo congresso norte-americano a Lei Keene, que proibia as atividades de mascarados no combate ao crime. Isto fez com que vários super-heróis deixassem a carreira, como o Coruja (Patrick Wilson) e Espectral (Malin Akerman). Outros, como o Comediante (Jeffrey Dean Morgan) e o Dr. Manhattan (Billy Crudup), passaram a trabalhar para o governo. Dois anos antes da implementação desta lei Adrian Veidt (Matthew Goode) decidiu revelar sua identidade como Ozymandias, dedicando-se a partir de então na construção de um império econômico. Em 1985 o mundo vive o clima da Guerra Fria, no qual um ataque nuclear pode acontecer a qualquer momento, vindo dos Estados Unidos ou da União Soviética. Neste clima de tensão política Edward Blake, o Comediante, é assassinado. Em seu funeral comparecem, em momentos diversos, seus antigos companheiros. Entre eles está Rorschach (Jackie Earle Haley), que acredita que sua morte seja o indício da existência de um assassino de mascarados.

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Watchmen – O Filme | Crítica

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Observação: há SPOILERS da HQ – o que é o mesmo que dizer que podem haver spoilers de… digamos, 95% do filme.

Durante muito tempo, foi considerado impossível levar Watchmen para os cinemas – e como ressaltei ao escrever sobre a graphic novel, o trabalho de Alan Moore e Dave Gibbons parece ter sido pensado para funcionar somente dentro dos padrões da Nona Arte, já que trazia os famigerados Contos do Cargueiro Negro intercalados com os quadros que contavam a trama principal e ainda incluía diversos fragmentos de livros, fichas criminais, revistas e jornais fictícios ao final de cada capítulo da obra. Anos se passaram e diretores como Darren Aronofsky, Paul Greengrass e Terry Gilliam quase dirigiram o longa (este último foi o que chegou mais perto de assumir o projeto e desistiu depois que o próprio Moore o convenceu de que a HQ era inadaptável, chegando a ter ideias para um desfecho diferente onde Dr. Manhattan viajaria no tempo e impediria o acidente responsável por tê-lo concebido), mas levou mais de duas décadas até que Zack Snyder (revelado no bem-sucedido remake de Madrugada dos Mortos e catapultado no bom 300) se encarregou de transpor para as telonas aquela que é frequentemente referida como “a melhor história em quadrinhos de todos os tempos”.

E o resultado dificilmente seria muito diferente: roteirizado por Alex Tse e David Hayter (dos dois primeiros X-Men), Watchmen – O Filme exibe sérias dificuldades de comprimir 12 edições de uma graphic novel tão profunda em 163 minutos de projeção e, na tentativa de resgatar apenas o que julga ser realmente importante na obra original, acaba soando como um “the best of Watchmen“. A consequência disso é que muitos aspectos responsáveis pela complexidade da história são eliminados em função do tempo escasso: a conversa entre Dr. Manhattan e Espectral em Marte é terrivelmente rasa; o arco dramático onde Coruja vence sua impotência soa apressado demais; o diálogo entre Rorschach e um psiquiatra se resume a uma única cena (não dá para entender o porquê do vigilante subitamente resolver contar suas verdadeiras origens); personagens como o jornaleiro, o casal de lésbicas e o garoto que lia quadrinhos são limados, o que tira grande parte do impacto que poderia haver na imensa destruição ocorrida no terceiro ato; e vários detalhes incluídos naqueles “livrinhos” que vinham depois de cada volume da HQ desaparecem.

Além disso, Snyder e a dupla de roteiristas se limitam a reproduzir cada quadro, acontecimento e diálogo da graphic novel de maneira literal, algo que evidencia ainda mais o quão desafiadora é a tarefa de transformar Watchmen numa produção condizente com mídias audiovisuais e elimina qualquer surpresa que poderíamos ter com a adaptação (o único evento realmente inesperado surge quando o longa está se encaminhando para seu desfecho). Claro que, mantendo-se extremamente fiel ao material-fonte, a película mostra-se mais ambiciosa e tematicamente instigante que a maioria dos blockbusters hollywoodianos; afinal, não é todo filme de “super-heróis” (com ou sem aspas) que se dá ao trabalho de parar a narrativa para questionar o quão benéficas são as habilidades especiais de seus personagens, colocá-los no status de deidades, situá-los num universo que pouco se diferencia da realidade, investir em altíssimos graus de violência e trazer uma cena de sexo que simboliza como um justiceiro sente-se na necessidade de salvar vidas e impedir ações criminosas em vez de se conformar com um banimento infeliz. Ainda assim, os melhores momentos de Watchmen – O Filme são aqueles que trazem algum diferencial com relação à história em quadrinhos – e a cena em que Rorschach pune o assassino de uma menina, por exemplo, torna-se bem mais assustadora (o fogo é substituído por um cutelo), é concluída com uma fala sombria (“Homens são presos; cães são sacrificados.“) e se beneficia dos aspectos inerentes à linguagem cinematográfica, como fotografia (que evita iluminação e carrega em tons marrons), design de som (que cria tensão através de barulhos de cortinas e ruídos metálicos) e trilha sonora (ouvir o que Tyler Batescompôs num ambiente escuro deve ser genuinamente assustador).

Já do ponto de vista estético, Watchmen – O Filme representa um deslumbre do início ao fim: remetendo ao clássico Taxi Driver nos instantes em que vemos Rorschach interagindo com o submundo de Nova York, o designer de produção Alex McDowell recria o universo frio e desagradável imaginado por Alan Moore e Dave Gibbons com a devida (e absoluta) fidelidade, mantendo as características visuais que indicam a influência que os “super-heróis” exercem sobre o mundo e preservando itens intrínsecos à realidade da graphic novel, como os dirigíveis extravagantes, os produtos da empresa de Adrian Veidt (como a lata de desodorante usada por um dos personagens) e um cartaz do jornal direitista New Frontiersman trazendo uma notícia cujo cabeçalho contém em letras garrafais a palavra “right” pichada/complementada com “-wing” (formando o termo “right-wing“, ou “extrema direita”). E se o figurinista Michael Wilkinson retrata os vigilantes como ícones através de uniformes detalhados e esplendorosos (que contrapõem a imundice das vestimentas de Rorschach), o diretor de fotografia Larry Fong investe em tons azulados com a mesma eficácia que emprega o sépia nas sequências ambientadas em Marte, aliando-se ao senso estético competente de Zack Snyder para dar origem a imagens estonteantes de tão lindas (e não é à toa que estou apertando várias vezes o botão “PrintScreen” do laptop apenas para “enfeitar” este texto, algo que deixei de fazer com regularidade há um bom tempo).

Quanto ao elenco, todos enfrentam o perigoso desafio de conferir naturalidade às linhas de diálogos presentes no roteiro que Alan Mooreescreveu para os quadrinhos, que são reproduzidas de modo literal e que não necessariamente funcionam no Cinema. Aparecendo com um sorriso desengonçado que tenta esconder o grande vazio existente dentro de sua persona, Patrick Wilson compõe Dan “Coruja II” Dreiberg com um sujeito claramente desconfortável e que jamais consegue disfarçar o sentimento de saudades de um passado glorioso, ao passo que Jackie Earle Haley cria um Rorschach sempre intimidador através de uma postura física moderadamente calma que sugere uma frieza encontrada também em sua voz rouca e amedrontadora. Em contrapartida, se Jeffrey Dean Morgan é hábil ao estabelecer o Comediante com o deboche e a agressividade que o transformam numa figura repulsiva e detestável, Malin Akerman surge pavorosamente inexpressiva e jamais consegue esconder o fato de que, na prática, está apenas lendo a HQ (mas também há outros integrantes do elenco que falham de vez em quando em seus esforços de ocultar esta realidade), ao passo que o fraco Ozymandias de Matthew Goode soa mais como um vilãozinho genérico e insuportavelmente arrogante do que como um herói disposto a criar tragédias por bons motivos, o que é um erro fatal por parte tanto do roteiro quanto do ator. Já Dr. Manhattan é o que mais sofre com a redução das 12 edições da graphic novel em 163 minutos e seu arco dramático acaba se tornando o mais superficial (e no que diz respeito à computação gráfica usada para concebê-lo a partir dos movimentos de Billy Crudup, pode-se dizer que, quando o personagem surge em primeiros ou primeiríssimos planos e se move menos, os efeitos visuais são bastante eficientes; mas quando ele é avistado através de planos mais abertos e se movimenta mais, a artificialidade da criação digital é evidenciada e o superser parece “borrachudo” demais).

Por fim, chegamos àquela que certamente é uma das falhas mais graves de Watchmen – O Filme: a insistência de Zack Snyder em tratar os justiceiros mascarados como se fossem mais poderosos do que realmente são, o que dá a entender que o diretor tem sérias dificuldades em se desprender de algumas de suas marcas registradas (como a estilização e o excesso de câmera lenta). Assim, o que temos aqui são super-heróis (hey, notem que, desta vez, não usei aspas!) que desafiam as leis da gravidade constantemente e se machucam com mais dificuldade, algo que contradiz a premissa básica de Watchmen: imaginar como seria a realidade se pessoas normais decidissem se vestir com roupas extravagantes e combater bandidos comuns nas ruas (até, claro, surgir um ser realmente superpoderoso que, no caso, chama-se Dr. Manhattan). Aqui, Rorschach não torce o pé ao cair de mais de um andar, Espectral atravessa um teto em queda livre e pousa numa posição chamativa, Comediante é morto depois de um embate físico elaboradíssimo e Coruja, ao vestir seu uniforme pela primeira vez após anos, é enquadrado através de planos grandiosos que o exaltam como se fosse uma figura bem mais imponente do que deveria ser. Mas nada se compara ao exageradíssimo momento onde Laurie “Espectral II” Juspeczyk e Dan “Coruja II” Dreiberg enfrentam uma gangue de assaltantes num beco (que, por sinal, conta com um nível de violência muito mais elevado – e apelativo – que o necessário). Para completar, não dá para entender o porquê de Snyder ter excluído a morte de Hollis Mason da versão que foi para os cinemas, mas mesmo assim perder tempo com cenas de luta como aquela que traz Coruja e Espectral numa prisão.

(E aqui vai um adendo: como não havia a menor possibilidade de resumir 12 capítulos em cerca de duas horas e meia, a produção lançou também Watchmen: Director’s Cut e, mais tarde, também revelou uma versão definitiva intitulada The Ultimate Cut, que inseria a animação dos Contos do Cargueiro Negro no filme. Assisti a esta última e posso dizer que, de fato, a inclusão de personagens como o jornaleiro e o menino que lia quadrinhos é benéfica – embora eu ainda sinta uma falta tremenda do casal de lésbicas e de um desenvolvimento mais amplo da vida do psiquiatra da prisão -, mas a presença das histórias animadas de piratas infelizmente reforça aquilo que já foi dito: adaptar Watchmen para o Cinema é praticamente impossível. Sendo assim, os Contos do Cargueiro Negro soam perdidos no meio da narrativa, não dialogam diretamente com a trama principal e quebram consideravelmente o ritmo da película – e do ponto de vista técnico, a animação é bastante limitada, ao mesmo tempo em que a fotografia emula com eficiência o trabalho que o colorista John Higgins realizou para a HQ clássica. Apesar da boa narração feita por Gerard Butler nestes trechos, ainda prefiro o corte que foi para os cinemas.)

Fortalecido pela excelente seleção musical que vai de The Sound of Silence até All Along the Watchtower (a canção Hallelujah, em especial, é introduzida de forma inesperadamente irônica, como se a própria produção celebrasse com bom humor uma vitória conquistada por certo personagem), Watchmen – O Filme representa uma experiência agradável não por conta de seus próprios méritos, mas sim por fazer com que o espectador se lembre o tempo todo de um material que era infinitamente superior. Como fã da graphic novel original, confesso que sou incapaz de não gostar do filme e já fui compelido a revê-lo várias vezes, mas isto se deve mais ao talento de Alan Moore que ao de Zack Snyder (que existe, para que fique claro).

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