Apocalipse

Título Original

X-Men: Apocalypse

Lançamento

19 de maio de 2016

Direção

Bryan Singer

Roteiro

Simon Kinberg

Elenco

James McAvoy, Jennifer Lawrence, Michael Fassbender, Sophie Turner, Oscar Isaac, Nicholas Hoult, Evan Peters, Tye Sheridan, Rose Byrne, Kodi Smit-McPhee, Alexandra Shipp, Lucas Till, Josh Helman, Ben Hardy e Olivia Munn

Duração

144 minutos

Gênero

Nacionalidade

EUA

Produção

Bryan Singer, Lauren Shuler Donner, Simon Kinberg e Hutch Parker

Distribuidor

Fox

Sinopse

O primeiro mutante destruidor do mundo, Apocalipse, está de volta disposto a acabar com a humanidade. Professor Xavier conta com Mística, Fera e Mercúrio, além de novos alunos, para impedir o vilão.

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X-Men: Apocalipse | Crítica

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Confesso que tenho uma admiração especial pelos X-Men: criados em 1963 a partir de uma dica dada pela esposa de Stan Lee quando este se encontrava sem ideias para criar novos personagens para a Marvel Comics, os mutantes eram seres temidos por conta de suas condições naturais e serviam como uma clara metáfora para a intolerância contra minorias – o que muitas vezes tornava compreensíveis até mesmo as motivações dos vilões, que frequentemente queriam se vingar pelo preconceito que sofriam. Graças a isso, foi um alívio descobrir que as HQs dos heróis foram adaptadas para o Cinema de maneira fabulosa ao longo de anos, rendendo uma fascinante trilogia e os excelentes Primeira Classe Dias de um Futuro Esquecido – inclusive, foi graças a esta franquia que os filmes de super-heróis foram catapultados de vez em Hollywood. E é justamente por isso que descobrir o quão incompetente é este X-Men: Apocalipse deixa de ser “apenas” uma imensa decepção para provocar um sentimento ainda pior: o de que fomos traídos por um amigo querido que já conhecíamos há 16 anos.

Roteirizado pelo mesmo Simon Kinberg de X-Men 3Dias de um Futuro Esquecido (yay!) e Quarteto Fantástico (urgh!), o novo longa se passa em 1983, quando humanos e mutantes finalmente parecem conviver em harmonia, e traz Charles Xavier, Mística, Fera, Jean Grey, Ciclope, Moira, Mercúrio e Noturno lutando contra En Sabah Nur (ou Apocalipse), o primeiro homo superior da História que, depois de passar séculos hibernando debaixo de uma pirâmide soterrada, é acordado depois que a luz do Sol o ilumina entre as ruínas da destruição e põe em prática um plano para mostrar a todos a dimensão de seus poderes, eliminar a Humanidade, dominar o que vier depois e blábláblá. E… é basicamente isso, não há muito mais a ser dito. Ah sim, Apocalipse reúne Magneto, Tempestade, Anjo e Psylocke para serem seus quatro “cavaleiros”. Pronto.

Abandonando completamente as alegorias sociais que sempre diferenciaram os X-Men da maioria dos outros heróis de quadrinhos e que foram mantidas em todos os outros cinco filmes do supergrupo (inclusive no subestimado X-Men 3), Apocalipse aposta numa trama rasa que poderia ter sido concebida por qualquer criança de poucos anos de idade e que soa ainda mais ridícula quando consideramos que o cerne da franquia X sempre girava entorno de questões sérias e adultas. Por falar nisso, Simon Kinberg merece ser punido (não fisicamente, que fique claro) por conta de seu horrendo desempenho: além de tratar a maioria dos personagens como meros bonecos de ação, o pavoroso roteiro se resume a uma coleção de clichês que já poderiam ser considerados constrangedores bem antes da onda de filmes de super-heróis ter começado e beira o novelesco quando tenta desenvolver conflitos dramáticos – isso quando não está investindo em piadinhas esquecíveis e aborrecidas.

Contudo, nem o mais tolo dos diálogos (“Ele tirou isso da Bíblia“, diz Alex Summers. “Ou a Bíblia tirou dele“, responde Moira) ou a mais óbvia das frases de efeito (esta já deve ter sido a milionésima vez que ouço a frase “As pessoas temem o que não compreendem“) se iguala às inexplicáveis mudanças de personalidade ocorridas em certos personagens ou aos notáveis furos de roteiro e situações mal explicadas – e o modo com que o conflito com Apocalipse é solucionado (sem spoilers) apenas denuncia a falta de inteligência do vilão. Por mais que a Fox tente acreditar que realizou um reboot da franquia no ótimo Dias de um Futuro Esquecido, o máximo que foi feito naquela produção foi varrer para debaixo do tapete infinitas incoerências cronológicas criadas ao longo das quatro películas anteriores. Desta forma, é difícil aceitar que os eventos grandiosos de X-Men: Apocalipse não tenham repercutido nos três primeiros filmes – e percebam também que não há uma explicação considerável para que uma personagem tenha decidido realizar uma investigação que involuntariamente fez com que o vilão despertasse.

E como se não bastassem as alterações de comportamento convenientes que ocorrem no clímax da narrativa, o segundo ato ainda perde tempo com uma participação especial de um certo personagem conhecido sem sequer se dar ao trabalho de justificá-la, não passando de um fan service barato e que resulta numa coincidência absurda demais para ser admitida (sério que tais pessoas tiveram um encontro inesperado exatamente com o mesmo indivíduo com quem conviverão no futuro?). E já que citei cenas que surgem soltas e aleatórias no decorrer da projeção, é incompreensível que o montador John Ottman apresente um desempenho tão problemático depois de seu excepcional trabalho em Dias de um Futuro Esquecido, demonstrando uma nítida dificuldade ao alternar entre múltiplas subtramas e se perdendo por cortar o clima de cada uma delas – aliás, a prova definitiva do quão sintomática é a montagem de X-Men: Apocalipse encontra-se numa sequência que referencia Star Wars e que surge do nada em meio a outra cena. Por outro lado, ao menos a produção acerta ao deixar de lado a paleta de cores fria dos longas anteriores e empregar tons fortes que remetem às HQs dos anos 1990 (visualmente lembra A Era do Apocalipse), embora a fotografia adote um filtro escurecido que dilui boa parte do charme da película.

Se estabelecendo como uma espécie de Transformers via Batman Eternamente com retoques de Quarteto Fantástico, este sexto X-Men é comandado por Bryan Singer de maneira preguiçosa e blasé; o que é inacreditável, já que o ponto forte do filme anterior era justamente a notável evolução de Singer como diretor. Aqui em Apocalipse, porém, o trabalho do cineasta chega a ser assustador de tão estranho: apelando para símbolos visuais bregas e infantis (como naquele instante onde um personagem forma um “X” com duas vigas de aço para impedir que o vilão-título se aproxime de outra pessoa), a direção consegue a incrível proeza de não realizar um único momento verdadeiramente original ou empolgante durante 90% do tempo. Os únicos instantes onde Singer apresenta algum preciosismo são aqueles que revelam fotografias tiradas por Moira, que abordam uma tragédia ocorrida na vida de Magneto e um plano onde um símbolo bastante conhecido pelos fãs de quadrinhos aparece em volta de Jean Grey.

Infelizmente, não há nada que salve o interminável terceiro ato, quando a produção simplesmente decide ignorar qualquer sentimento de urgência e se entrega à destruição grandiloquente que faria Michael Bay ter orgasmos múltiplos, gerando uma das batalhas mais exageradas e impessoais que me recordo de ter visto nos últimos anos (e assim como ocorria no final de O Homem de Aço, Apocalipse não expõe interesse algum em explorar por um segundo sequer o fato de que milhões de pessoas morreram brutalmente). Diabos, como uma franquia que vinha se mostrando tão ambiciosa e madura quanto X-Men poderia ter rendido um filme que falhasse tanto desta forma? E se Mercúrio surpreendia roubando a cena em Dias de um Futuro Esquecido, aqui a sequência que traz o personagem numa mansão (ainda que divertida) soa mais como uma dose de adrenalina injetada com desespero numa obra sem vida e desalmada.

Todavia, James McAvoy e Michael Fassbender se esforçam para conferir alguma dignidade a um roteiro tenebroso: enquanto o primeiro até consegue encarnar Charles Xavier com sabedoria e experiência próximas à versão do professor vivida por Patrick Stewart, o segundo faz o possível para transformar Magneto num personagem interessante mesmo que seu arco dramático seja composto por obviedades e clichês – e a dignidade com que Fassbender recita frases artificiais como “Oh, meus bebês!” é uma prova de sua eficácia como ator. Em contrapartida, Moira MacTaggert é inútil na maior parte do tempo enquanto Nicholas Hoult (brilhante em Mad Max: Estrada da Fúria) é preso a um Fera sem novidades. Já Mercúrio e Noturno divertem ocasionalmente com algumas tiradas capazes de abrir pelo menos um sorriso de canto de boca, ao passo que Tye Sheridan compõe um Ciclope melhor do que aquele vivido por James Marsden (o que não quer dizer muita coisa). Enquanto isso, Sophie Turner frustra imensamente como a nova Jean Grey, mantendo exatamente a mesma expressão neutra até nos instantes em que sua personagem se encontra emocionalmente abalada (e caso a atriz já tenha demonstrado em outros projetos, isto não vem ao caso aqui).

Ao mesmo tempo, Mística ilustra uma problema gravíssimo: depois de X-Men: Primeira Classe, Jennifer Lawrence rapidamente tornou-se uma das grandes estrelas de Hollywood, sendo eternizada na franquia Jogos Vorazes e ganhando um Oscar por seu desempenho em O Lado Bom da Vida. Com isso, a produção é obrigada a mostrar a atriz como ela é o tempo inteiro (vejam o pôster!), ignorando o lema “mutante com orgulho” que a personagem repetia desde que Lawrence integrou a série X-Men e descaracterizando completamente a mutante (e juro: Mística deve ter surgido em sua forma azul cerca de três vezes no decorrer de toda a projeção e a primeira ocorre por volta da metade do filme). Fora isso, os três Cavaleiros do Apocalipse além de Magneto representam outro desapontamento colossal: Tempestade começa prometendo ser mais interessante que a versão interpretada por Halle Berry, mas tal potencial é jogado no lixo ainda no primeiro ato e a personagem passa a entrar muda e sair calada; Anjo é introduzido e, logo em sua segunda cena, já é transformado em Arcanjo (o que não é spoiler, pois todos já viram os trailers), sem nenhum arco dramático a ser percorrido para que nos importemos com o jovem mutante; e Psylock não faz nada além de… marcar presença – e isto é tudo o que posso dizer sobre ela, visto que Olivia Munn aparece de vez em quando e, ao longo do filme inteiro, traz uma quantidade de falas genéricas que pode ser contada nos dedos de uma única mão (não, eu não brincando!).

O que nos traz, é claro, ao Apocalipse: desperdiçando de forma vergonhosa o profundo talento de Oscar Isaac (cuja carreira inclui Inside Llewyn DavisEx_MachinaO Ano Mais ViolentoO Despertar da Força e a minissérie Show Me a Hero), o vilão é movido por desejos imbecis e se limita a olhar para o nada enquanto diz um monte de bobagens num tom de voz monótono – e a comparação com Power Rangers não se aplica somente ao visual de En Sabah Nur, já que suas intenções e atitudes corroboram para que o personagem pareça ter saído daquele seriado (até a direção de Singer enquadra o antagonista através de ângulos televisivos e sem inspiração). Pra piorar, o visual de Apocalipse aparenta querer explorar o conceito de ridículo, apelando para figurinos e maquiagens toscas que envergonham num momento onde um plano se fecha no rosto do vilão quando este observa uma televisão – e completando o constrangimento, sua voz modulada gera risadas involuntárias, chegando a lembrar a voz de Galadriel quando sofria daqueles surtos em O Senhor dos Anéis (e só isso já deveria levar o Framboesa de Ouro a criar uma categoria nova para poder “premiar” o patético trabalho de mixagem de som visto aqui).

É curioso e até irônico que haja uma cena onde uma personagem afirma que “o terceiro filme é sempre o pior” (numa clara alfinetada em X-Men 3), visto que, como desfecho da trilogia iniciada por Primeira Classe Dias de um Futuro EsquecidoX-Men: Apocalipse enquadra-se perfeitamente neste estigma. E se muitos alegaram que “faltava Bryan Singer” em O Confronto Final, chega a ser trágico descobrir que este mesmo Bryan Singer é um dos principais responsáveis por terem transformado este sexto capítulo da franquia X não apenas no mais fraco da série, mas num dos piores filmes de super-heróis dos últimos tempos.

Entre efeitos visuais irregulares e maquiagens insatisfatórias (ninguém parece ter envelhecido mais que cinco anos desde Primeira Classe), X-Men: Apocalipse é algo mais amargo do que um desapontamento: é – e me perdoem a grosseria, pois não consegui encontrar um termo mais apropriado – uma cagada absoluta.

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